sábado, 25 de agosto de 2018

FC Porto 2 x 3 Vitória SC | Trivelas & Roscas


Inacreditável. Inacreditável como voltámos a desperdiçar uma vantagem de dois golos. Inacreditável como isso acontece pelo segundo jogo consecutivo, desta vez em casa, cheia, perante o nosso público. Inacreditável como a equipa só acordou verdadeiramente para a vida após o terceiro golo deles. Inacreditável como o Vitória chega ao terceiro, de bola parada e sem qualquer lampejo de organização defensiva da nossa parte. Inacreditável como se desperdiça um empate no derby lisboeta e ainda se consegue fazer pior. Inacreditável como o regresso de Marega trouxe de volta o kick and rush sem sentido. Inacreditável como se produz tão pouco e se falha tanto. Não direi melhor que o @j7seabra: foi a pior exibição do FC Porto da era Sérgio Conceição, depois da pior exibição do FC Porto da era Sérgio Conceição. E se isto não chega para ser alarmante, é suficiente para ser preocupante.



Óliver: O único que me fez verdadeiramente acreditar que ainda era possível um milagre à Jamor. Por outras palavras, o único que manteve o discernimento após o revés e que explorou outras soluções que não a velocidade de Marega nas suas investidas junto à bandeirola de canto.



Quem não? Naturalmente que houve uns piores do que outros. Maxi esteve péssimo nas ações defensivas e pecou no passe. Sérgio Oliveira fez um throwback a 2010 e Herrera mastigou demasiado o jogo em momentos que exigiam mais pragmatismo. Na frente, Aboubakar continua inexistente, Soares ainda não regressou e Marega prolonga a sua crise existencial no relvado. Contas feitas, Sérgio Conceição é o grande responsável por este desfecho horrível, que preferia muito mais ver no Fantasporto do que no Estádio do Dragão. Há tanto, mas tanto a rever.

Organização defensiva: O segundo golo é um bom exemplo do desequilíbrio defensivo que a equipa tem apresentado no arranque desta temporada, mas é o terceiro que incomoda. Compreenderia se o tivéssemos sofrido num contra-ataque, numa transição rápida, por estarmos inclinadíssimos para a frente sem olhar para trás. Mas não foi isso que aconteceu. Sofremos na sequência de um lançamento lateral (!), com cinco homens na linha defensiva (!!), sem que houvesse um que estivesse atento a Davidson. Hell no.


domingo, 19 de agosto de 2018

CF Belenenses 2 x 3 FC Porto | Trivelas & Roscas


Há três tipos de jogos. Os que se esquecem mais rapidamente do que a tabela das velocidades do Código da Estrada; os que ficam eternizados na memória, com cada lance decorado e debitado até à forma mais irritante da exaustão, como um filme de Myazaki ou uma composição de Max Richter; e os que nos matam. O segundo jogo do FC Porto na Liga 2018/19 foi um destes últimos. Não me recordo da última vez que ganhámos com um golo aos 95'. Honestamente, não me recordo do último jogo ganho nos descontos depois do momento Kelvin. Mas em boa verdade, no preciso momento em que vos escrevo, não me lembro de nada, depois do bungee jumping de emoções que vivi nos últimos 30 minutos. Vencemos e isso, no fim de contas, é o que interessa. Mas com um empréstimo da sorte e com alguns sinais preocupantes, como a incapacidade em gerir um resultado tão favorável. Valeu pela crença e pelos três pontos resgatados num campo (kind of) onde o ano passado os deixámos.



Diogo Leite: Jogo seguríssimo do miúdo, coroado com um golo e um aviso saudável a Militão, que terá de conquistar o seu espaço. No lance do penalty, não há muito a dizer. Tal como Xistra. marcaria ambos os penalties. Porque tanto um gesto como o outro são o tipo de lance que quem joga futebol sabe reconhecê-lo. Não são movimentos anatomicamente instintivos. O primeiro instinto do corpo humano quando se prepara para receber o impacto de um objecto é encolher-se, com os braços a liderar esse movimento e a proteger de imediato as zonas mais sensíveis. Tanto Diogo Leite como Henrique não tinham qualquer tentativa deliberada de interceptar a bola, mas usaram os braços para reduzir as hipotéticas trajetórias da bola. É precisamente por isso que existe a regra da volumetria, criada pelo International Board: a ideia de que um jogador abre os braços para aumentar o volume do corpo e reduzir assim ainda mais a possibilidade da bola passar. Pedro Henriques, o ex-árbitro, explicou-a depois do jogo. Durante os poucos anos em que joguei futebol federado, fui lateral-direito num clube das distritais de Lisboa. E em lances de área também abria o corpo para ganhar dimensão sabendo perfeitamente o que estava a fazer.

Otávio: A prova de que não sou um hater primário é o facto de Otávio aparecer nas Trivelas pela segunda vez consecutiva. Na primeira parte, conseguiu ser dos mais esclarecidos, no marasmo de ideias que foi o jogo ofensivo do FC Porto. Fez por merecer o golo, logo no arranque da segunda, numa leitura inteligente e oportuna, importantíssima para arrancar do Jamor os três pontos.

Maxi: Só pecou quando deixou Keita fugir-lhe nas costas no golo do empate do Belenenses. E mesmo aí, a culpa está longe de ser só dele. Trabalhador incansável, fez um jogo muito completo, com a capacidade física que se lhe conhece. Aos 90', andava na área adversária à procura do 2x3. No minuto seguinte, está na área do FC Porto a matar uma iniciativa do Belém. Teve dificuldades em travar Fredy na primeira parte, mas porque Fredy fez um jogaço de grande nível. Mesmo por aqui, Militão vai ter de suar para entrar no onze.

Belenenses: O ano passado tinha deixado um elogio ao futebol belenense de Silas, a única equipa capaz de roubar pontos a todos os grandes. Pedi-lhe que continuasse a ser igual a si próprio e o rapaz não me desiludiu. O Belenenses soube pressionar com eficácia e mostrou uma fluidez invejável na saída de bola, com o trio da frente a evidenciar mais inteligência nas movimentações à frente da área do que os jogadores do FC Porto na primeira parte. O Belenenses arrisca demasiado na saída de bola? Sim. Erra com equipas que pressionam alto como o FC Porto? Claro. Mas Silas teve tomates para manter a sua identidade e nem depois do segundo golo a sua equipa perdeu a cabeça, numa demonstração clara de frieza e pulso para jogar ao mais alto nível. A mutação de Diogo Viana de extremo medíocre para lateral competente é obra de Silas. A descoberta de Ljujic, sérvio que secou Sérgio Oliveira enquanto esteve em campo, no campeonato australiano também. Não faltará muito para que Silas comece a constar nas shortlists mais improváveis.



Reação: O FC Porto não pode esbanjar uma vantagem de dois golos daquela forma. Nunca. Compreendo que um penalty assinalado 5 minutos depois cause turbulência anímica nos jogadores, mas é aí que Sérgio Conceição deve intervir. O próprio treinador se deixou contagiar pela reacção nervosa da equipa depois do 2x1, demorando a ler o jogo e a resolver o que estava mal. Logo após o golo de Fredy, o FC Porto lançou-se numa corrida desenfreada e ansiosa pelo 3x1 que desequilibrou a equipa e acabou por permitir o empate. Foram 30 minutos de futebol sem fio condutor e sem cabeça, típico de uma equipa que está... a perder. Se fomos competentes sem ser exuberantes na primeira parte, muito por culpa da pressão do Belenenses, o adversário deve o empate à nossa incompetência em quase todo o segundo tempo. Não é um golo aos 95' que apaga o que (não) foi feito antes.

Aboubakar: Péssimo. É certo que foi prejudicado pela inércia dos colegas do meio-campo, que criaram pouco na primeira parte, mas isso não o iliba de cinco ou seis más definições que transformaram hipotéticas oportunidades de golo em jogadas sem memória. Parece ter começado a pré-época há duas semanas, tal é a forma como mata diversos lances com recepções assustadoras, que não vemos nem num hotel fantasma. Precisa de botar ritmo.   

Sérgio Oliveira: Não é que tenha passado ao lado do jogo, porque a sua presença física foi crucial para travar o atrevimento do Belenenses em certos momentos, mas ofensivamente não existiu. A somar, um par de erros defensivos absurdos que quase davam golo. Não esteve nos seus dias.

domingo, 12 de agosto de 2018

FC Porto 5 x 0 GD Chaves | Trivelas & Roscas


O campeão FC Porto arrancou a Liga 2018/19 com a melhor exibição de Liga 2017/18. Não me recordo de ver um caudal ofensivo tão intenso em nenhum jogo da época passada, exceptuando talvez a recepção ao Paços de Ferreira (6-1). E mesmo aí a dinâmica morreu mais cedo. Ontem, entre os 88 e os 94 minutos, o FC Porto criou três ou quatro situações claras de golo, fruto de processos simples, mas que estão a maturar no barril há mais de um ano. Convenhamos que este Chaves vigiou pior o seu território do que um segurança da Primark em época de saldos, ainda à procura da melhor versão com Daniel Ramos. Mas a verdade é que as clareiras abertas pelos flavienses foram exemplarmente aproveitadas pelos atacantes do FC Porto, num registo de pragmatismo e eficiência na ocupação dos espaços que era geralmente exclusivo de um jogador que ontem nem lá esteve: Moussa Marega. Embora ainda seja demasiado cedo para entrar em apreciações profundas, os primeiros sinais são promissores e a evolução é inegável. Não serão certamente 33 jogos assim, mas se o benchmark for a noite de ontem, estou convicto de que vamos ser bicampeões.


Brahimi: Há um ditado no mundo árabe que é qualquer coisa como isto: se Brahimi não vai ter com a bola, a bola vai ter com Brahimi. Yacine fez ontem uma das melhores exibições que o vi fazer com a camisola do FC Porto. Impressionante a forma como se desdobra na ala com Telles, sem deixar de falar a mesma língua que Aboubakar. O seu drible curto, cada vez mais afiado, parecia uma faca quente sobre a manteiga de Chaves. Lidaram com ele, pelo menos, quatro jogadores adversários no 1x1. E voltaram todos sem histórias para contar. Confidenciei com os meus pares no Twitter que Brahimi não é importante para a revalidação do título: é fundamental. Pelo que a sua mais do que provável saída a custo zero na próxima época é um preço que pagarei sem grande sacrifício. Os negócios do FC Porto ainda são as vitórias.

Aboubakar: Se não estivesse em pré-época, teria feito mais golos, tal foi a quantidade de ocasiões que desperdiçou e os momentos em que demonstrou ainda não estar na melhor forma. Não deixa de ser, contudo, o avançado mais objetivo que temos neste momento (Soares está indisponível e Marega está numa realidade paralela). Belo trabalho no primeiro golo, ao nível do que nos habituou. Conclusão simples no segundo, sob pena de levar uma marretada do mister se não marcasse. Excelente trabalho de entendimento com Brahimi no terceiro, que praticamente matou o jogo.

Maxi: Excelente jogador este jovem recrutado no defeso ao Defensor Sporting do Uruguai. Tem uma maturidade assinalável para alguém tão novo: parece que já conhece o campeonato português de trás para a frente. Esteve seguro a defender e exímio no apoio ao ataque. Mas o melhor de Maxi é a capacidade física, que mesmo num jogador de 22 anos é invulgar. Com um pulmão incrível e uma qualidade técnica assinalável (não fosse ele extremo de formação), prevejo que lá para os 28 anos deva atingir o pico da carreira.

Sérgio Oliveira: Irrepreensível. Sérgio é um jogador inteligentísimo, que nem sempre encontra no jogo a melhor forma de manifestar o seu futebol. Recorrendo à velha metáfora dos bólides no futebol, Sérgio está cada vez mais parecido com um Range Rover. Traz um excelente sistema de navegação e conta com um forte poder de tracção. O problema é que não se vai adaptar a todo o tipo de estradas. E é por isso que temos um roadster no banco que será certamente mais útil noutras pistas.

Otávio: Disclaimer: sou um dos maiores críticos do brasileiro porque nunca lhe reconheço velocidade e competência suficiente para fazer rodar a bola. Contudo, ontem foi um dos melhores. A pressionar, a procurar linhas de passe, a jogar de cabeça levantada. A jogada do 2x0 é um passe magistral de Sérgio Oliveira que só existe porque Otávio percebeu onde estava o espaço.



Nuno Almeida/Vasco Santos: A Liga pode mudar de slogan quantas vezes quiser, que enquanto mantiver os cancros no activo, será apenas só mais uma competição com interesse interno para meia dúzia de parvalhões como eu. Nuno Almeida esteve péssimo na avaliação dos lances e nem creio que tenha sido só contra o FC Porto. É que não acertou, literalmente, uma. Perdoou um penalty sobre Otávio, um amarelo a Maxi e teve de recorrer ao VAR para transformar a entrada de sola de João Teixeira sobre Sérgio Oliveira no merecido vermelho. Pelo meio, Brahimi também podia ter levado um amarelo. Um chorrilho de más decisões que só torna o futebol português ainda mais periférico.



André Pereira: Não é propriamente um reforço, mas vocês percebem a ideia. Teve apontamentos interessantes, tendo sido uma óptima bengala para Aboubakar, chegando mesmo a cheirar o golo a espaços. Está a obter um rendimento que não esperava dele, não tenho qualquer problema em reconhecê-lo. Não creio que Pereira seja um matador por excelência, mas se for o sidekick incansável que foi ontem, os colegas vão ter de lhe pagar uma grade no final da época.

Leite: É mesmo preciso escrever alguma coisa? Quem acompanha os B e os sub-19 já sabia que Diogo é um nome abençoado na formação portista. É provável que Militão possa ganhar o lugar nos próximos tempos. Digo isto porque Militão é um central feito, que vai acrescentar poder de fogo nas bolas paradas ofensivas. Por isso, espero que Leite não seja engavetado. Seria uma pena. É o melhor central a sair da formação azul-e-branca desde Ricardo Carvalho.

Adrian: Só não percebi porque não foi aproveitado o ano passado, se a estratégia já passava por jogar com dois avançados. Talvez por falta de compromisso. A verdade é que este ano parece mais empenhado e integrado do que nunca. Ontem, a par de Otávio, foi dos mais inteligentes a ler o jogo sem bola. Vai ser muito útil. Nunca é tarde para a redenção.

Marius: Se calhar é aqui que eu e tu vamos divergir. Claro que um miúdo do Chade que vem de um submundo futebolístico e humano diretamente para o Dragão e marca na estreia é uma imagem que dificilmente esquecerei. Claro que o ambiente lhe pesou nos 15 minutos em que esteve em campo, onde a vontade e a ansiedade o sabotaram, causando-lhe alguns momentos de precipitação. Marcou e foi merecidamente feliz, tendo ainda a humildade de ir agradecer o golo a Sérgio Oliveira. Mas é evidente que há uma camada de terra muito densa sobre ele que precisa de ser polida - nem se esperava outra coisa. Por mim, é o tipo de jogador que vai precisar de (muitos) minutos na B mas que manteria sempre por perto. Com uma boa gestão, esta aposta pode ter um bom desfecho. Espero que, daqui a uns tempos, a única dúvida que nos reste seja entre chamar-lhe SuperMarius ou Marius Jardel.