quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Besiktas 1 x 1 FC Porto | Trivelas & Roscas


Descer ao inferno e voltar vivo. O FC Porto atravessou os 90 minutos mais diabólicos de que me recordo nos últimos anos e sobreviveu. Não é que a Turquia seja um local azedo para a memória portista, bem pelo contrário. A estatística ainda nos dá razão. Mas convenhamos que o Besiktas 2017 é substancialmente diferente dos antecessores, mais Europeu, mais técnico e sobretudo mais atlético. O empate foi um prémio justo para a competência táctica dos nossos na primeira parte e lisonjeiro para uma segunda parte pouco acima de sofrível, onde a superioridade física dos turcos fez a diferença. Resistimos à avalanche sonora mais famosa do futebol e mantivemos esta bela tendência de resolver as deslocações difíceis, o que me faz acreditar que este grupo pode bem ser capaz de aguentar uma aula inteira de Educação Moral e Religiosa. Não quero ser demasiado ambicioso, contento-me para já com o bom futebol que temos apresentado à Europa e com todas as hipóteses e mais alguma de seguir em frente na prova, numa época em que se dizia que o FC Porto ia morrer de tuberculose antes de Novembro.


Posicionamento nos primeiros 45': O FC Porto desdobrou-se bem em campo na primeira parte, ocupando os espaços com critério durante a transição defensiva. A vitória do FC Porto nesse período foi posicional. No ataque, esteve sempre dependente das descidas de Aboubakar no terreno e dos solos de Brahimi, com o trio do meio-campo mais preocupado em suster do que em criar. Mas, a nível defensivo, a dinâmica colectiva funcionou bem, sendo traída pelas falhas individuais. Foi pena o golo do empate ter nascido de um desses pecados.

Ambiente: Abandon hope all ye who enter here. O Besiktas Park (oficialmente Arena Vodafone), sucessor do mítico Inonu, é um monstro vivo. E não é só barulho. Os Ultras do Besiktas sabem como intimidar um gajo que está a ver o jogo no sofá da sua sala a uns confortáveis 4000 kms, com cânticos que parecem vociferados em aramaico. É insana a forma como os turcos vivem o futebol, dando ao jogo um significado sobrenatural e abrindo uma clareira na floresta de interesses, poder e dinheiro que cercou a modalidade. Qualquer verdadeiro adepto de futebol tem de ter um dos principais estádios turcos na bucket list. O Diabo mora ali.

Jose Sá: Grande jogo, um par de defesas importantíssimas e confiança cheia. Está a deixar para trás as dores de crescimento.

Laboratório: O golo do FC Porto nasce de um livre que se transforma numa bonita jogada ensaiada. Dos dez golos marcados pelo FC Porto na presente edição da Champions League, seis foram em lances de bola parada. Um número revelador, que mostra que nem todos os laboratórios precisam de propaganda para serem notados pela crítica.


Quebra nos segundos 45': Uma boa parte do sucesso deste FC Porto passa pelos dois poços de força que tem no ataque, secundados pela magia do amigo baixinho. O trio BAM fez falta na Turquia. Marega para ajudar no braço de ferro no último terço, libertar Aboubakar da inglória tarefa de lidar sozinho com Pepe e Tosic e permitir que as deambulações de Brahimi tivessem melhor aproveitamento. O argelino que tantas vezes teve de parar e rodar enquanto procurava destino para a bola. Sem andamento para a Jandarma que comandava o meio-campo turco, a queda drástica da qualidade de jogo do FC Porto na segunda parte foi natural. O FC Porto foi perdendo discernimento. Não havendo Herrera, não havia Sérgio Oliveira. E não havendo os dois médios mais avançados, não havia construção, levando a equipa a refugiar-se mais atrás e a aproveitar uma ou outra saída rápida para criar perigo. Sérgio Conceição demorou um pouco a mexer e quando o fez foi, no mínimo, discutível.

Felipe: Com Felipe vale mesmo tudo. Desde silenciar um estádio turco com um golo à ponta-de-lança a demonstrações de banha da cobra à entrada da sua própria área. Uma delas está directamente ligada ao golo do empate e Felipe só não saiu da Turquia com pesadelos porque Sá é um gajo cinco estrelas. Não sei se foi contagiado pelo nervosismo geral da equipa ou se foi ele o paciente zero dessa insegurança. Mas agora que experimentou a sensação de jogar com os tímpanos furados, receber o Estado Lampiânico e a sua máquina de propaganda no Dragão vai ser duck soup. Né, Felipe?

Pinto da Costa: "Não contratei o Sérgio para não tentar ganhar ou melhorar. Para isso ia buscar o Lopetegui". Claro que aceito uma leve insolência do presidente mais titulado do mundo, memória curta não. Trazer Lopetegui ao barulho foi incorrecto. Para não dizer que Lopetegui foi, em última instância, aprovado por si. Tal como Robson, Mourinho e Villas-Boas. Ou Octávio, Couceiro e Peseiro. A desresponsabilização fica mal a Pinto da Costa. Além disso, Lopetegui? O tal basco que, sozinho, defendeu o FC Porto num tempo em que no Dragão não havia baluartes? Nos anos em que o polvo andava refastelado? Desnecessário.

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terça-feira, 21 de novembro de 2017

Habemus Treta


O ano é 2017, mas o Benfica comporta-se como se estivesse em 1984, procurando vedar a realidade com uma narrativa alternativa, retalhada e distópica.

Falo da mais recente iniciativa do clube para tentar apagar o fogo em que está metido no caso dos emails… com fumo.

Um espetáculo absolutamente deprimente e sem ponta por onde se lhe pegue, mais próximo da apresentação de um trabalho de grupo de outcasts do 7º ano do que uma televisão gerida por profissionais da comunicação.

O circo montado por José Marinho foi embaraçoso. O zombie de Vieira prometia petróleo, mas só trouxe areia. Substrato que mais não serve do que para encobrir uma investigação cada vez mais esclarecedora sobre a face oculta da águia.

O "Novo Apito Dourado", assim baptizado - talvez pelos mesmos criativos que pensaram o nome do Novo Banco -, era afinal uma recompilação mal parida do velho Apito Dourado a que se somam umas quantas novas suposições, com a respectiva prova documental a resumir-se a um powerpoint com informação reciclada e extrapolações assentes não em factos mas rumores e opiniões. Sem uma linha argumentativa incontestável, um fio condutor decente, raciocínios aceitáveis, nada. Um freakshow extremamente vazio e especulativo, sem substância nem seriedade, conduzido com o mesmo rigor de uma alpaca a operar um cérebro. Hora e meia de vergonha alheia.

Os últimos meses foram ricos em revelações sobre o que se passa atrás do pano, onde a bola não chega, e mostram como os corredores do futebol são actualmente mais encarnados do que um filme de Stanley Kubrick.

É inegável a existência de uma rede de proteção e favorecimento ao Benfica cujo poder de alcance extravasa os limites do próprio clube. Uma engrenagem movida por gente que se cansou da genética perdedora do Benfica e tentou manipulá-la, alterando as variáveis que preservavam a higiene do desporto nacional.

Ao contrário do triste espetáculo patrocinado pelo Benfica, o FC Porto tem apresentado factos que indiciam a viciação de uma das maiores e mais lucrativas indústrias do país. São factos porque aconteceram. Aconteceram porque já foram directa ou indirectamente confirmados por quem os praticou.

Factos esses que não escondem apenas pressões ou jogos de poder. Indiciam manobras de corrupção, tráfico de influências, coação, ameaças, proxenetismo e outros crimes cometidos por elementos ligados ao Benfica. E isto só na ponta do iceberg.

O "Chama Imensa" é a resposta típica do encurralado. A reação tímida de alguém a quem a carapuça assenta. Uma nova bala mágica que visa atingir o mesmo alvo das anteriores: minar a opinião pública, reescrevendo a História.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Vale tudo

"Todos são rápidos para julgar e opinar sobre a vida dos outros,
mas são cegos e mudos para a vida própria."
Felipe

O que distingue a maioria dos portistas do carnaval que os rodeia é a capacidade de olhar para dentro. Eu, que sou portista por convicção e não de nascimento, sei o que isso é.

No Benfica, já se sabe, o culto é cego. Os benfiquistas defendem o clube como pais defendem o filho bully que rouba a turma e arreia na professora. A culpa nunca é dele, mas dos outros. Sempre.

Já a idiossincrasia sportinguista, sendo mais moderada, anda adulterada por uma espécie de lampionismo agudo que tem contagiado Alvalade à mesma velocidade com que a legionella percorre hospitais. No entanto, não é só na redneckosfera que as bombas rebentam nas mãos dos terroristas morais.

A época arrancou em Agosto. Foi preciso chegar a Novembro para ver o primeiro jogo da época em que o FC Porto sai com saldo positivo da incompetência da equipa de arbitragem. Sim, teríamos perdido pontos na última jornada, em casa, frente ao Belenenses. Mas isso não equilibra nem de perto uma balança que no outro prato tem penalties sonegados contra Estoril, Tondela, Braga, Moreirense e Paços. Lances que só não tiveram influência na classificação porque o FC Porto passou-lhes por cima.

O que ainda é menos justificável é a onda de indignação gerada após a partida no Dragão, prontamente calada pelo karma no dia seguinte, onde o Sporting ganhou um ponto graças a uma actuação desastrosa de Carlos Xistra.

Mais desonesto ainda - e aí entramos no ramo da filha da putice intelectual - é querer associar Fábio Veríssimo ao FC Porto e FC Porto a Fábio Veríssimo, como se viu por aí. Fábio Veríssimo, benfiquista assumido e denunciado, já foi responsável directo por quatro pontos mal atribuídos ao Benfica esta temporada. Nos jogos do seu clube, teve sempre uma invulgar capacidade para descobrir offsides ao milímetro e sem tecnologia. Nos jogos do FC Porto, infelizmente, Veríssimo não aparenta ter o mesmo olho de lince, tendo sido responsável por decisões que podiam ter lesado o clube e desvirtuado a verdade desportiva. Por isso, nem vale a pena tentar perceber a estrutura lógica de um raciocínio absurdo.

O Sporting já percebeu com quem terá de lutar pelo título. Talvez por isso se tenha rendido à hipocrisia habitualmente praticada do outro lado da Segunda Circular. Mas enquanto o mundo debatia os encontrões de Felipe, o Benfica voltou a passar entre os pingos da chuva, beneficiando de uma impunidade que, quando não oferece directamente a vitória, ajuda a construí-la de forma discreta. Pelo meio, o Estado Lampiânico aproveitou para adensar a cortina de fumo que tem camuflado a verdadeira Liga Vale Tudo: a que corre nos relvados e bancadas por onde a passa a caravana encarnada.

Sabemos que o Benfica não gosta de Felipe Augusto. O que é compreensível para quem tem Filipe Augusto.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

FC Porto 3 x 1 RB Leipzig | Trivelas & Roscas


Sérgio, quando li o XI que escalaste para a partida frente ao Leipzig fiquei mais eurocéptico que os Le Pen. Tal como a esmagadora maioria dos portistas, esperava mais presença e proteína no meio-campo e não um motor a dois tempos a competir com a elevada cilindrada dos alemães, como constava do teu esboço inicial. Sou dos que acha que a saída forçada de Marega foi um mal que veio por bem e corrigiu a tua ideia arrojada mas peregrina de despovoar o centro. Nunca vamos saber realmente o que podia ter acontecido se tivesses jogado mais tempo só com dois médios. Na volta, até ganhavas. Mas desta importante vitória sobra apenas uma certeza: a de que criaste um grupo incrivelmente autoconfiante e mais unido do que um sindicato nos anos 80. Até conseguiste por os habituais artistas a solo a preocuparem-se mais com a banda e menos com a performance individual. Esse é o teu maior mérito, ainda que o teu pensamento táctico permaneça, por vezes, difícil de decifrar aos olhos do cidadão comum sem o nível IV do Curso de Treinador da UEFA. Por isso, não me ligues, sou apenas treinador de chaise lounge, que não ganha uma Champions no FM desde o tempo do Chapuisat. Em suma, sou um completo ignorante. E desde que continues a ganhar, vivo bem com isso.


Transcendência: Um dia, na preparatória, houve um concurso de matemática. A participação era facultativa, mas os meus pais incentivaram-me a entrar. Com o mesmo jeito para os números que Paulo Fonseca tem para nomes e a velocidade de raciocínio de um Pesaresi, lá entrei na olimpíada. Fiquei em último ou perto disso e jurei para nunca mais. Hoje em dia, sou analista financeiro. Reparem que o FC Porto nunca se apresenta como o maior de Portugal. Nem como o mais eclético. A força do FC Porto não vem de cima nem de baixo. Não vem das massas nem das elites. Vem da unidade e da união. Vem do trabalho e da vontade. Da cultura de superação que inspira os seus adeptos a vencer na vida. Durante uma boa parte da partida, os alemães foram mais fortes. Mas nós fomos aquilo que realmente somos: melhores.

Mexicanos: Não fizeram grande espada no arranque, mas a reorganização imprevista do tetris do jogo beneficiou-os. Tecatito cresceu com o relógio, destacando-se sobretudo pelo contributo defensivo, onde foi o grande amigo de Ricardo até sair lesionado. Há dias em que Corona percebe que é tão importante ser irreverente a atacar como civilizado a defender e nesses dias as coisas correm geralmente bem ao FC Porto. Já Herrera sentiu as costas quentes com a entrada de André André, que o empurrou para a frente e lhe permitiu concentrar mais na distribuição e menos na cobertura ao centro. Exibição prática, coroada com um golo e assombrada por um ou outro passe criminoso, tão típicos de um jogador que tanto dá pontos como tira anos de vida.



Ideia inicial: Keita, Kampl e Sabitzer não são médios tugas de 28 anos que passaram ao lado de uma grande carreira, nem volantes brasileiros formados no Buscapé de Itaguaçu e negociados pela Traffic. São três bestinhas com cultura de futebol europeu que daqui a um ano (Keita já está reservado pelo Liverpool) estarão em clubes maiores do que o Leipzig, sem desprimor. Se na Alemenha três médios portistas foram insuficientes, dois no Dragão parecia um hospital em greve, deixando antever um abismo aterrador no miolo, sem se perceber muito bem como é que a equipa iria colar setores só com Herrera e Danilo a comunicarem por telégrafo. A verdade é que nem mesmo com André André retomámos o controlo teórico do jogo, apesar de esta ideia de controlar sem ter a bola ser um princípio do qual Sérgio Conceição não vai abdicar.

Lesões: Além de Corona, Marega e logo na altura mais ingrata. Primeiro, porque nos deixa o ataque no osso em vésperas de novo ciclo exigente. Depois, porque o maliano vivia a melhor fase da carreira e temo que esta paragem de mais ou menos um mês lhe possa tirar algum ímpeto. Lembremo-nos que Marega passou de flop a proscrito, a solução temporária, a gajo-que-até-nem-está-a-jogar-mal-mas-quando-Soares-voltar-o-lugar-é-dele, a indiscutível do FC Porto. É uma pena o músculo ter sucumbido quando mais precisávamos dele. Juro que não sei o que é maior. Se o meu desejo para que volte depressa ou se a surpresa por estar a escrever esta frase.

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Segue-se o Belém a contar para aquilo que mais conta, o campeonato. Como tu bem acabas de dizer, Sérgio, amanhã "é ganhar ou ganhar, não há outra opção".