quarta-feira, 27 de setembro de 2017

AS Mónaco 0 x 3 FC Porto | Trivelas & Roscas


Agora que a excitação de ontem já acalmou um bocado, vamos por as coisas em termos simples. O jogo no Principado foi a melhor exibição do FC Porto esta época, depois de a recepção ao Portimonense ter sido a melhor exibição do FC Porto esta época. Isto só pode significar uma de duas coisas: ou a equipa está a crescer ou eu ando a ver futebol de pernas para o ar. Embora menos provável, esta segunda hipótese é mais plausível do que aparenta. É que a inclusão de Sérgio Oliveira no onze - até ontem um jogador com zero minutos de competição, pouco óleo, sem pegada histórica no clube e uma expectativa reduzida de almejar uma carreira superior a Josué - foi provavelmente a aposta mais arriscada que a capital europeia dos casinos alguma vez viu. Eu, que tenho a mania que percebo alguma coisa de fruta, estava assumidamente cético. E redondamente errado. Sérgio Conceição não foi ao Louis II inventar, mas reinventar o pouco que tem, com as peças que ele conhece melhor do que ninguém e que sobrevivem a qualquer preconceito de bancada. Conceição prometeu e cumpriu. Pelo meio, deu ainda uma lição a quem ainda por vezes acredita que o futebol é uma ciência exacta. Como eu.



Andy Marega/Dwight Aboubakar: Hey, eu sei. Acho a lucidez importante e não pretendo de forma alguma comparar um dos duos jurássicos da história do futebol a esta startup promissora que Marega e Aboubakar estão a formar. Mas esta dupla de avançados, que foi levedando no FC Porto sem darmos por isso, está a dar cartas. E a sua química lembra a de Andy Cole e Dwight Yorke, o dueto sinfónico do Manchester United na década de 90. Parece-me evidente que Vincent e Moussa jogam muito melhor juntos do que isoladamente. Esse holismo ficou patente na partida frente ao Besiktas, onde o todo não foi a soma de todas as partes. Com Marega, Aboubakar ganha mais espaço para se movimentar. Com Aboubakar, Marega tem menos responsabilidade para finalizar e torna-se num jogador mais objetivo. O terceiro golo do FC Porto exemplifica o melhor que podemos esperar do maliano - processos simples e directos. Não é preciso ser-se um predestinado da bola para fazer um passe daqueles, mas é necessário possuir uma qualidade ainda mais invulgar no mundo do futebol: humildade. A humildade de saber entender o nosso papel e de resistir à tentação de absorver o protagonismo. Enquanto tivermos uma dupla que se complementa desta forma, só podemos ter motivos para estar otimistas.

Sérgio Conceição: Por várias razões. Em primeiro lugar, soube aprender com os erros da primeira jornada e percebeu que um meio-campo com dois elementos é insuficiente para equipas com caparro europeu. Em segundo, soube ler onde estava o calcanhar de Aquiles deste Mónaco de Leonardo Jardim e montar uma estratégia onde, alienando a posse, manteve o controlo durante praticamente os 90 minutos. Em terceiro, além dos milhões, dos três pontos e da tonelada de prestígio, o FC Porto trouxe de França um “reforço”: Sérgio Oliveira. E por último, Conceição deixou definitivamente uma mensagem ao plantel. Todos contam e todos jogam. Em apenas 9 partidas, sem taças, todos os jogadores (de campo) do plantel já somaram minutos. Haverá maior demonstração de confiança no grupo?

Herrera: A nação portista dá primazia a importantes parceiros, tais como Brahimi, Ricardo, Felipe, Marcano, Alex Telles, Oliver, Aboubakar, Casillas, Danilo, Marega, Layún, Corona, Diogo Dalot, José Sá e outros parceiros não menos importantes nas vitórias do FC Porto. Há um pouco novo chefe de Estado angolano, João Lourenço, em todos nós, quando se trata de esquecer Herrera. Mesmo quando joga bem. O caso de ontem, com o mexicano a trabalhar imenso, sobretudo a nível defensivo, tendo sido crucial para engolir o miolo francês, alimentado pelo sempre genial João Moutinho. Foi também o pêndulo da equipa em grande parte das transições rápidas, aplicando uma vez mais o tal futebol pragmático que se vislumbrou contra o Portimonense e que se costuma ver nos jogos da seleção mexicana. É uma versão aprimorada de um jogador que tem muito mais sumo do que aquilo que tem dado. Talvez tenha encontrado em Sérgio Conceição o espremedor certo.


Não há, e isso por si é extraordinário. Podia pegar pela tendência público-privada deste FC Porto em abrir auto-estradas no centro quando se entusiasma em demasia no ataque, mas a verdade é que, ontem, o sector recuado esteve quase sempre imperial - com o grande contributo de Sérgio Oliveira nesse particular. Em vésperas de um clássico complicadíssimo, Mónaco deixa-nos a certeza de que o horizonte é mais azul do que a água nas praias de Monte Carlo.

@

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Basta!

Basta de Fernando Gomes, o subserviente líder da FPF, cujas SMS foram ilegalmente vigiadas e usurpadas pelo Benfica para benefício próprio, desvirtuando com isso a verdade desportiva nos últimos quatro anos. Fernando Gomes, que sempre se furtou a abordar esse assunto, quebrou hoje um longo e perturbador silêncio. Um silêncio que resistiu estóico à denúncia do esquema de corrupção promovido pelo Benfica, à revelação dos emails que emporcalharam o futebol em Portugal, ao segundo homicídio cometido por uma claque ilegal e ao apoio ilícito de um clube a essa claque. Foi necessário o Benfica entrar numa crise de resultados para Fernando Gomes falar. A credibilidade da FPF, em particular a do seu presidente, entraram num coma irreversível onde a melhor opção é deixar morrer.

Basta de Nuno Cárcomo, o lobo com pele de cordeiro que parece filho de um casamento entre a hipocrisia e o descaramento. O presidente da Associação de Futebol de Lisboa, que quer “centralizar o poder na capital”, deixou a toca para defender as palavras de Fernando Gomes, com um discurso cínico, imprudente e vago, característico de um operacional à paisana do Estado Lampiânico. Nuno Cárcomo Lobo diz que “acompanha, desde há muito, as preocupações agora registadas”, mas não mencionou que o estado climatérico tempestuoso do futebol nacional é também da sua responsabilidade. E do seu centralismo bacoco, anti-portismo primário e racismo indigente.

Basta dos NN. Vultos sem nome e sem rosto responsáveis pelos únicos dois homicídios por ódio clubístico no país. Marco Ficcini e Rui Mendes morreram às mãos da claque do Benfica. Fernando Madureira escapou a uma emboscada com machados e cabos elétricos. Filipe Santos sofreu um grave traumatismo craniano que o deixou à beira da morte. Há um bando de homicidas à solta que rubrica os crimes em nome do Benfica e as autoridades continuam a assobiar para o lado.

Basta da justiça desportiva. E da sua inércia inerente quando o arguido é vermelho. Já passaram três meses desde que o BenficaGate começou a ser investigado pela Polícia Judiciária, a que se somam mais umas semanas desde que o polvo foi destapado e despido pelo FC Porto. A única coisa que mudou desde então foi a ruborização assumida do sector da arbitragem em Portugal e a consciencialização internacional em relação ao problema. Lá fora, já perceberam de que calibre é feito o Benfica. Cá dentro, já todos tínhamos percebido. Mas nem a Liga nem a FPF começaram a inquirir quem quer que seja.

Basta do Estado Lampiânico. É do fundamentalismo insensato, desregrado e anti-lógico que grassa a verdadeira ameaça para o ambiente. É da segmentação entre anjos e demónios que os Rumiyahs desportivos alimentam desde o Apito Dourado e da consequente diferença de tratamentos que se vê agora no BenficaGate que espreita o perigo para a imagem do futebol português. É de ciclopes como José Marinho ou paquidermes como Pedro Guerra, funcionários ou ex-funcionários do Benfica, que vem o cheiro que afugenta os cães. É dos crimes verbais de parasitas como José Manuel Antunes ou Pragal Colaço que resulta a chuva ácida que encharca o pano. A canonização cega do Benfica é o objectivo de muita gente com poder e responsabilidade, embriagada em líquido amniótico encarnado, que só vive e respira bem se o Benfica ganhar, seja a que preço for.

Basta da imprensa. Que não escrutina, não questiona, não investiga, que não abre a gaveta proibida. Por mero sabujismo, por coacção ou por falta de distanciamento. O quarto poder está enclausurado no terceiro anel. E ainda há quem fique ofendido por ser apanhado em flagrante.

Basta. Antes que seja tarde demais.



segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Rio Ave 1 x 2 FC Porto | Trivelas & Roscas



Passaram sensivelmente 100 dias desde que Sérgio Conceição pôs o azul no branco com Pinto da Costa e decidiu sair da zona de conforto francesa para ousar uma aventura no cemitério de treinadores da Invicta. Se em junho recebesse uma visita do Drax de setembro para me dizer que íamos chegar à sétima jornada com o pleno de vitórias, 14 golos marcados e apenas um sofrido, pediria encarecidamente ao meu “eu” do futuro que abandonasse o vinho, pois nem nas minhas projeções mais quiméricas estava à espera de números tão requintados. E, acreditem, eu sonho todos os anos com um cenário onde o FC Porto conquista a Liga dos Campeões com um 5-4 ao Real Madrid, depois de estar a perder 0-4 ao intervalo. Mas a verdade é que cá estamos, em setembro, na liderança, com o máximo possível de pontos conquistados no campeonato, com a melhor defesa da Europa, o segundo melhor ataque em Portugal e já com três cabeças de borrego à cintura, numa prova inequívoca de que estamos vivos e prontos para não dar descanso a ninguém, apesar de termos um plantel menos talentoso e completo do que os rivais. O que vou dizer a seguir pode parecer uma perspetiva resultadista, e é, mas define aquilo que pode ser a chave da matriz ganhadora do FC Porto em muitas das deslocações mais perigosas desta época: o Rio Ave dominou, mas o FC Porto materializou. No final, o que contam são elas lá dentro.



Danilo Pereira: Voltou. Depois de um arranque de temporada intermitente, o trinco que mais me enche as medidas desde o fim do mandato do Polvo regressou à velha forma fazendo uma exibição absolutamente soberba, na forma como contribuiu para suster a linha média do Rio Ave o mais atrás possível, impedindo a construção do adversário em toda (toda!) a largura. Além do golo, o comendador foi essencial para que a estratégia de “jogar sem bola” montada por Sérgio Conceição, dando amplitude ao jogo e assegurando que os dois homens do meio-campo vila-condense produzissem o mínimo possível. Garanto-vos que não sou do clã Carreira, embora isto pareça plágio, uma vez que esta crónica foi escrita depois de ter lido as do Tribunal do Dragão, do Porto Universal, do Porta 19, etc. Qualquer semelhança com os demais é pura coincidência. Ou então é simplesmente a consequência natural de todos termos visto o mesmo jogo.

Brahimi: Começa a ser um padrão inegável. Quando o FC Porto actua em campos curtos, Brahimi destaca-se. Com mais ou menos objectividade, empurra a equipa para a frente e, mais importante, acaba por injectar na equipa uma confiança decisiva nos momentos cruciais. Exemplo disso foi a convicção que emprestou à cavalgada meio atabalhoada de Marega, o que fez com que o maliano não desistisse do lance e aparecesse para o finalizar. Jorge Bertocchini, autor do Porta 19, tem uma tirada sublime sobre isto, que recupero aqui para ilustrar melhor aquilo que quero dizer. Disse o Jorge, no rescaldo do FC Porto x Besiktas, que Brahimi “espetou pregos numa parede sem que ninguém pendurasse um quadro que se visse”. Uma expressão que resume na perfeição o papel actual do argelino do argelino no FC Porto. Está menos artista e mais curador. Só precisa que um dos matulões do ataque o ajude a pendurar os quadros. Foi o que fez Marega. Assim se conquistam três pontos.

Marega: “Guarda o que não presta e terás o que te faz falta”. Isto foi o que meu avô me respondeu um dia, quando lhe perguntei porque raio é que estava a apanhar um parafuso torcido e enferrujado do chão. O velhote era um hoarder de primeira a quem nós, antes dos anglicismos tomarem conta da língua portuguesa, apelidávamos carinhosamente de “sucateiro”. Sérgio Conceição podia ter abdicado de Marega. Mesmo depois do pequeno episódio do início de época. Era o mais fácil. Mas ainda assim, o treinador portista, contra a corrente dominante de pensamento na qual me incluo, guardou o parafuso. Marega é o principal retrato de um plantel recauchutado. Não é que o maliano seja, ou possa vir a ser, o principal alicerce em que vão assentar todos os sucessos que o FC Porto pode acumular esta época. Acredito até que, com a evolução natural da temporada, a sua preponderância se possa desvanecer um pouco, em função do que Soares pode dar à equipa. No entanto, tem dado jeito, muito jeito. É desonesto fechar a porta a essa evidência. O Moussa que ainda nos embaraça com recepções piores do que uma residencial na Cova da Moura é o mesmo Moussa que por vezes leva tudo à frente -- e a equipa em bloco, às costas -- como se estivesse a desembarcar de carabina na mão na Normandia. Por isso, não há margem para crítica. Quem dá o que tem, a mais não é obrigado. Talvez seja melhor direccionar a crítica a quem contribuiu para que o actual barómetro de qualidade do FC Porto seja Marega e não um Falcão ou um Jardel. Puxando a memória atrás, tenho a certeza que o meu avô arranjou finalidade para aquele parafuso, tal como Sérgio Conceição o fez para as características do maliano. Não posso pedir mais.

Borrego no saco: A deslocação de um ombro, de um joelho ou de um pulso podem ser chatas, mas nenhuma é tão incómoda como a deslocação ao Estádio dos Arcos para o FC Porto. Já são nove pontos ganhos em campos extremamente difíceis. Um dado que pode dar um impulso extra na segunda metade do campeonato, onde, neste capítulo, o calendário é bem mais acessível.



Otávio: Houve uma fase em que cheguei a pensar que Otávio estava em sub-rendimento. Agora, tendo mais a considerar que o início da época passada é que foi um pico anormal na forma do jogador brasileiro. Otávio parece desligado dos processos da equipa. Amorfo e desconcentrado, continua a não compreender o seu papel em campo, mesmo quando o mesmo é claro. Não fosse Sérgio Conceição o treinador que lhe deu o banho mais eficaz de cultura táctica quando aterrou em Portugal, diria que o problema estava na orientação. Mas não está. A rever.

Meio-campo sem Óliver: Apostar numa estratégia sem Óliver é compreensível. Herrera dá (e deu) muita coisa ao jogo que o espanhol não oferece, mas sem Óliver, o FC Porto foi controlado no miolo, praticamente do início ao fim, onde só a transcendência de Danilo evitou maiores desequilíbrios. Sérgio arriscou e saiu-se bem. Esta foi também uma mensagem de confiança ao mexicano, que, com o nervo no lugar, pode ser mais solução do que problema. Mas era importante que a SAD priorizasse desde já um ataque preciso e contundente ao mercado de inverno que trouxesse uma alternativa credível ao espanhol. Porque Oliver não é apenas o nosso elemento mais criativo, é também o único.

@

sábado, 2 de setembro de 2017

Disciplina avariada

O que têm em comum Eliseu, Mabil e Derley?

Comecemos pelos dois primeiros.

Esta semana, o Conselho de Disciplina da FPF ilibou Eliseu da pisadela deliberada a Diogo Viana no Benfica x Belenenses, de 18 de agosto. No mesmo dia, o mesmo órgão considerou que Mabil "pisou o adversário com força excessiva" no Paços x Vitória SC, de 26 de agosto.

O processo de Mabil demorou apenas dois dias a ser apreciado. O de Eliseu levou dez. Mabil foi suspenso por dois jogos. Eliseu foi absolvido. As imagens que se seguem falam por si.

Eliseu x Belenenses

Mabil x Vitória SC

Nenhuma das resoluções surpreende, embora a lógica que alicerça ambas seja anedótica. Quer no caso Eliseu, quer no caso Mabil, a mesa presidida por José Manuel Meirim escuda-se no relatório dos árbitros para sustentar a decisão final. Mabil foi "apanhado" pelo fiscal de linha, por isso foi punido com base no que foi escrito pela equipa de arbitragem. Eliseu escapou impune porque nem o árbitro Rui Costa viu a agressão, nem o videoárbitro Vasco Santos achou que tivesse sido uma.

Vasco Santos, provavelmente o elemento com maior influência no desfecho deste processo, entendeu "não ter existido qualquer agressão ou prática de jogo violento por parte do jogador do Benfica naquela sua ação". Apesar de ter analisado as mesmas imagens que toda gente viu, onde nenhum ângulo mente, o elenco do CD concluiu que a demonstração marcial de Eliseu foi uma reação natural e inocente.

Com isto, o CD aproveita e mata dois coelhos de uma só vez. Cola o fundamento da decisão ao julgamento subvertido do VAR e refugia-se na sentença que menos ondas levanta contra o órgão: a favor do Benfica. Em suma, livra-se de responsabilidades na polémica e sem abespinhar o polvo. É o recurso a um truque sujo para lavar as mãos.

Ora, o Conselho de Disciplina está a enviar duas mensagens perigosas. Por um lado, deixa implícito que o VAR vai concentrar em si um poder de decisão desmesurado, em última análise maior do que o do juiz principal. Por outro, o CD está a dizer-nos que neste tipo de casos prevalece o parecer do videoárbitro, mesmo que a sua opinião seja contrária à de 99% da nação futebolística. Instituições responsáveis pelo bom funcionamento da prova incluídas.

Em condições normais, Vasco Santos seria convidado a abandonar a arbitragem depois deste episódio, onde só ele, Pedro Guerra e José Marinho não vêm maldade no movimento debulhador de Eliseu, que fez das pernas do jogador belenense um trampolim. Como não existimos num país normal, ratifica-se a decisão e assobia-se para o lado. Alguém, mais tarde, haverá de pagar a fatura.

Mas vamos mais longe. Ainda na terça-feira, o mesmo Conselho que decidiu avaliar a intenção em vez da intensidade no caso Eliseu optou por medir a intensidade em vez da intenção num lance de Derley (Aves) contra o Boavista.

Derley x Boavista

Deliberou o CD que Derley "pontapeou um adversário na cara com força excessiva" no Boavista x Aves. Mas olvidou o facto de, tal como no lance de Eliseu, ter sido uma disputa de bola, onde o jogador do Aves nem sequer se apercebeu a aproximação do guarda-redes adversário. No máximo, foi imprudente. Mas aceitemos a deliberação final do Conselho. Derley foi suspenso por dois jogos, tal como Mabil. Eliseu não. Notam a diferença?

A Liga NOS conta com um organismo regulador que, na mesma reunião, baralhou a própria conduta e utilizou dois pesos e duas medidas na análise a cada caso. Os princípios da racionalidade e da equidade na justiça desportiva já foram abandonados há muito, em prol de uma nova metodologia que obedece exclusivamente a uma cor. É nesta pocilga que boia o futebol português, onde só quem sabe chafurdar, ganha. E consta que há por aí um clube a reclamar a hegemonia.

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

A bonança imperfeita

Finito. O dia com os minutos mais contados do ano terminou, finalmente. A meia-noite de 31 de agosto, essa espécie reveillon futebolístico, não trouxe novidades de última hora ao FC Porto, o que era expectável. Por outro lado, também não houve raides por nenhuma pedra basilar da equipa. Um dado extremamente positivo, sobretudo no contexto actual.

Não é notícia o facto de o clube estar a passar por uma certa asma financeira, que dificulta a gestão do plantel e embarga os planos para o ciclo desportivo a longo prazo. Por isso, e sem surpresas, o FC Porto fechou o defeso sem qualquer contratação anunciada - além de Vaná.

No capítulo das entradas, o FC Porto perdeu. Perdeu porque tinha de perder. É óbvio que o Dragão procurou boas oportunidades de negócio ou operações financeiras equilibradas para fortalecer a equipa, mas quem se encontra no trapézio, neste momento, é o FC Porto. E a flexibilidade não abunda.

A nau portista sobreviveu ao vendaval do mercado sem rombos no casco. No entanto, continua sem mecanismos de emergência, o que torna qualquer acidente de percurso difícil de reparar. O XI base do FC Porto dispõe de qualidade suficiente para se candidatar ao título nacional, mas o plantel não tem a profundidade necessária para percorrer uma época longa, desgastante, com várias frentes e contra vários adversários. Dentro e fora de campo.

No global, estamos mais fortes, mais mecanizados e mais bem orientados do que no ano passado. Mas temos menos fail-safes.

Definhando a coisa por setores:


Na baliza, sobrevive o síndrome Bolat, que é aquela estranha patologia do FC Porto de comprar um guarda-redes low profile por época para nada. Confesso, quando vi o anúncio da contratação do guarda-redes brasileiro Vaná fiquei ali algures entre o satisfeito e o apreensivo. Satisfeito porque, por um lado, parecia que o FC Porto estava a dar sinais de estar financeiramente vivo e pronto para atacar o mercado. Apreensivo porque esta prática da SAD do FC Porto de coleccionar jogadores da mesma posição, não sendo nova nem exclusiva do nosso clube, é um fetiche que nunca deu grandes frutos, quer do ponto de vista desportivo quer da perspetiva financeira. Não é incomum ver o FC Porto contratar guardiões sombra, alternativas competitivas mas discretas, competentes mas diplomáticas, que saibam aceitar que a condição de partida é o banco. Entendi a contratação de Vaná como o destrancar da porta a José Sá para que o português pudesse ganhar rodagem para o futuro. Mas José Sá não saiu. O que significa que Vaná, que custou €1 milhão, deverá passar os próximos tempos entre a bancada e o sofá. Sobretudo, porque Sá tem uma vantagem assinalável para a restrita lista de inscrições na Liga dos Campeões: é português. Em relação a Fabiano, cumpriu-se o cenário mais provável. A sua presença no plantel é meramente figurativa: quando recuperar da lesão, deverá sair na próxima janela.



O dragão dispõe de três bons centrais e uma dupla que não dá grandes abébias a quem se queira por em bicos de pés. Felipe e Marcano são os zeladores fixos. Reyes estará lá para qualquer eventualidade. E só o pior cenário pode atirar Jorge Fernandes para o lago dos tubarões. Se o FC Porto tinha de cortar por algum lado, este seria um deles. Nas faixas, a permanência de Layún resolve o problema nos dois flancos. Importa saber qual será a disponibilidade psicológica do jogador, que me parece cada vez mais descomprometido do clube. A pior notícia foi a opção de compra com que Rafa foi para Inglaterra. A melhor foi a gripe de Ricardo Pereira. Porque foi apenas isso: uma gripe.


É talvez o que mais me preocupa. Desde logo, porque é o que está mais despido de alternativas directas aos titulares. Leia-se directas, não credíveis. Porque não se discute aqui a qualidade de André André, Herrera ou Sérgio Oliveira. A problemática prende-se com o facto de não existir homens que garantam a mesma estratégia de jogo que Óliver e Danilo fornecem à equipa. Com esta receita, o FC Porto joga de uma forma muito diferente de qualquer outro elenco. O meio-campo Danóli estará exposto a um desgaste absurdo ao longo da temporada, nomeadamente o espanhol, o alvo a abater, para quem uma visita ao estaleiro é mais certa do que Eliseu pisar alguém no próximo jogo. Por outro lado, esta é também uma oportunidade para quem cá ficou preso ao acaso. Moreto Cassamá ou Fede Varela estão à espreita.



Haveria coisa mais natural que integrar Alberto Bueno neste FC Porto? Um jogador cuja melhor fase da carreira foi precisamente num esquema de dois avançados? Se Sérgio Conceição conseguir, e Bueno quiser, o espanhol pode assentar que nem uma luva no plantel e ser mais do que uma mera ferramenta de recurso da equipa. Este ano, o segredo deste grupo passa - e muito - pelas segundas vidas de muitos jogadores proscritos. Reyes, Marega e Aboubakar são exemplos a seguir. Acima de tudo, porque o exemplo partiu deles próprios. Tem a palavra Alberto. Se Aboubakar, Soares, Marega e Bueno garantem profundidade ao centro, o mesmo não se pode dizer dos corredores. Brahimi e Corona são de outro campeonato. Otávio tem dias e Hernâni tem velocidade. E é só. O FC Porto não está apenas sem alternativas ao argelino e ao mexicano, também está dependente da forma - sempre volátil - de ambos.

@

No que diz respeito a entradas, o FC Porto não tem grande história para contar. Do lado das saídas, o saldo é positivo. E não estou a falar apenas de números. O FC Porto encaixou cerca de EUR70 milhões com a venda de cinco jogadores, sendo que somente um deles era titular regular em 2016/17. A venda de Ruben Neves é a que menos anima, tanto emocional como desportivamente, porque o médio tinha no modelo actual as condições certas para evidenciar as suas qualidades. Era o jogador mais apto para render Óliver ou Danilo. Deixando a futurologia para Nhagas e Zandingas, tenho a convicção de que Rúben Neves seria o 12º jogador do FC Porto de Sérgio Conceição.

Luís Gonçalves fez um trabalho excecional no alívio da folha salarial. O FC Porto desligou-se em definitivo de Josué, Abdoulaye, Ángel, Tiago Rodrigues e Sami, colocou Zé Manel, Boly e até Adrián López e ainda embolsou €300 mil com o empréstimo de Mikel. Não me recordo, nos últimos anos, de uma dieta tão rigorosa e eficiente. Urgia limpar todo este colesterol e, em grande medida, isso foi conseguido.

Nota final para os empréstimos de João Carlos Teixeira e Rui Pedro. Nada contra, até porque compreendo a necessidade de dar quilómetros e maturidade aos dois. Só não concebo os destinos: Braga e Boavista, dois emblemas que têm sido o espelho do antiportismo na região norte nos últimos anos. Há alianças bem mais nocivas do que certos antagonismos.