segunda-feira, 12 de março de 2018

Paços de Ferreira 1 x 0 FC Porto | Trivelas & Roscas

foto fcporto.pt

É extremamente irritante perder, seja de que forma for. E tentar imaginar mil cenários onde a derrota não aconteceria é uma quadratura do círculo que nada acrescenta a esta segunda-feira cinzenta. A verdade é que o FC Porto tombou num jogo com mais armadilhas do que a casa dos McCallister. A um relvado que parecia o festival do caldo verde, some-se as limitações da equipa, privada de quatro elementos fundamentais, a arbitragem a cargo de uma task force destacada pelo gabinete de crise, a má forma de alguns jogadores e um plano de jogo discutível por parte de Sérgio Conceição e temos a fórmula do "se tudo correr bem vai dar merda". E deu. Mas acima de tudo por dois factores que não estavam na brochura. A incapacidade do treinador em ler a partida e o anti-jogo do adversário que, sendo expectável, roçou um nível grotesco, atestado pela falcatrua do guarda-redes pacense quando se lançou na poça da vergonha derrubado apenas pela própria indecência. Vamos a notas.


Ricardo: Ontem, pouca gente fez um jogo conseguido. E mesmo os que escaparam à mediocridade não ultrapassaram o aceitável. Um deles foi Ricardo, que na primeira parte foi dos poucos que conseguiu conduzir a bola sem parecer que estava a limpar a água do quintal. Teve algumas incursões promissoras que acabaram quase sempre na leitura contracíclica de Aboubakar, na teimosia de Waris em bater a melhor marca pessoal nos 100 metros ou na incapacidade Corona em jogar com um bocadinho mais de humidade. Foi um dos dois ou três que assistiram às enfadonhas aulas de "Física do Futebol: O Comportamento da Bola em Relva Molhada" porque percebeu cedo que 98% dos passes longos para a corrida de X ou Y iam acabar com a bola a acelerar pela linha de fundo. Mas pronto, não chegou.


Sérgio Conceição: Nem melhor treinador do FC Porto nos últimos anos está imune à crítica. Não pode estar, porque também é humano, também erra. Ontem, Conceição falhou em toda a linha, desde o planeamento à execução. Desde logo porque a titularidade de André André só foi novidade para quem não lê jornais. E isso deixa-me exasperado porque me faz pensar que há toupeiras a cavar buracos onde não devem. Depois porque Conceição parece não ter um plano B para equipas que tenham muito pouca vontade de jogar à bola. O treinador do FC Porto quis desde o momento zero agarrar o jogo pelo meio-campo mas errou no casting, tendo demorado demasiado tempo a corrigi-lo. Por fim, não consigo perceber como Hernâni passa à frente de Paulinho ou Óliver, quando voltou a provar pela 3419ª vez que não traz rigorosamente nada de valor ao jogo. Agora, o que é realmente absurdo é este estranho fenómeno dos adeptos portistas de venerar tudo na vitória e espancar a eito na derrota. Termino como comecei porque para mim nunca houve dúvidas: Sérgio Conceição é o melhor treinador do FC Porto dos últimos anos. E vai continuar a sê-lo.

André André: Jogo horrível, provavelmente o pior que o vi fazer com a camisola do FC Porto. Todas as suas ações com bola, na primeira parte, foram praticamente nulas. Falhou todos os seus remates, cruzamentos, dribles e duelos aéreos, segundo uma estatística do Goalpoint publicada pouco antes do intervalo, o que demonstra bem o contributo que (não) deu ao colectivo. Também é verdade que não mereceu grande apoio de Sérgio Oliveira e foi forçado a assumir quase sempre sozinho as disputas pelas segunda bola, sem grande rede de segurança, pois nem Brahimi nem Corona nem Waris foram eficazes do ponto de vista posicional no primeiro tempo. Contudo, a surpreendente aposta de Sérgio Conceição para cadenciar o jogo saiu furada. A oscilar entre a hesitação e a precipitação, André André foi sempre um pêndulo descompassado que só agravou com o cronómetro. Mas a responsabilidade de ter ficado mais de uma hora em campo nessas condições não lhe pode ser imputada.

Penalties: Não me venham com cruzes nem credos. O FC Porto tem um índice de aproveitamento de penalties demasiado baixo para grande equipa e por detrás deste número tem de existir uma explicação racional. Não se treinam, não se estudam, não se trabalha o factor psicológico? O que acontece aos jogadores do FC Porto na hora do castigo máximo? Sérgio Conceição tem de responder (para dentro) a estas perguntas e resolver de uma vez por todas esta afta que cada vez mais problemática e arde como cornos na hora de morder o lábio. Posto isto, resta-me falar do episódio Sérgio Oliveira/Brahimi. Não me choca que o médio português Sérgio Oliveira tenha delegado o compromisso ao colega. Se não se sente confiante para assumir é perfeitamente aceitável que encarregue alguém que demonstre maior disponibilidade anímica. Chateia-me é ficar sempre com a ideia de que estamos a transformar a maior oportunidade de golo do futebol num complexo.

sábado, 10 de março de 2018

A estratégia do ruído


A notícia do Expresso de hoje vem confirmar a suspeita que gravita há muito sobre o universo benfiquista.

Não foi coincidência a mudança de estratégia por parte do Ministério da Propaganda lampiânica nas últimas semanas. O silêncio ensurdecedor deu lugar a uma overdose de ruído, que viajou desde as suspeitas sobre o Estoril x FC Porto ao novo treinador do Sporting. O objectivo? Tentar abafar o impacto iminente da detenção de Paulo Gonçalves.

Alguém acredita que um clube que condiciona e manipula dezenas de organismos nacionais, de tribunais a televisões, e que gere uma rede de toupeiras com acesso privilegiado a informação judicial, não soube antecipadamente da operação de detenção?

A injeção maciça de contrainformação promovida pelo Benfica não é nova. É impossível ignorar os paralelismos entre a denúncia anónima do Estoril x FC Porto e o alegado jantar entre Pinto da Costa e o árbitro Björn Kuipers, em 2011, uma fantasia que também foi alvo de denúncia fantasma no DIAP e ampliada pelos jornais, sem qualquer prova factual que a consubstanciasse.

O modus operandi é o mesmo. O vírus é plantado nas autoridades por alguém ligado ao Benfica e disseminado publicamente com a ajuda das habituais caixas de ressonância encarnada, como o jornal Abola, que lhe dá uma roupagem legítima e o coloca no topo da agenda pública. A história de suborno no Estoril x Porto é tão artificial que quem a noticiou sentiu necessidade de se justificar. Por fim, os opinion makers avençados e o resto dos peões pro-bono da propaganda encarnada levam ao limite a velha máxima de Joseph Goebbels, repetindo a mentira mil vezes até ela se tornar verdade.

Vejamos a denúncia do jogo do FC Porto. Uma acusação com fundações de papel, fruto de extrapolações altamente sugestionadas, que podem ser aplicadas a qualquer equipa em qualquer momento do campeonato. É a interpretação low cost dos factos. O sofisma do carro com vidros fumados, que se tem vidros fumados é porque esconde alguma coisa.

Nem o Estoril foi a única equipa portuguesa a receber pagamentos do FC Porto naquela altura, nem o FC Porto é o único clube a pagar dívidas a equipas da mesma liga em datas próximas dos jogos. Mas corrupção no Porto era a história que os adeptos do Benfica queriam ouvir, sobretudo num momento como este.

Enquanto foi vivo, o caso foi raspado até ao osso nas távolas redondas da comunicação social, levando o FC Porto a fazer o que na Luz ninguém faz: explicar com clareza e transparência, por via oficial, as operações financeiras que manteve com o Estoril.

O propósito final da propaganda encarnada foi alcançado: criar uma cortina de fumo para o que aí vinha. As visitas de Luís Filipe Vieira ao Campus da Justiça no âmbito da Operação Lex e a detenção iminente de Paulo Gonçalves. Pelo meio, atingir o mérito e a estabilidade do FC Porto foi só um bónus, nunca a principal directriz.

A detenção de Paulo Gonçalves só apanhou de surpresa os rivais. Porque na Luz continua a viver-se dez anos à frente. Das consequências, sobretudo.

domingo, 4 de março de 2018

FC Porto 2 x 1 Sporting | Trivelas & Roscas


Mais do que os golos, a maior herança que Jardel nos deixou foi esta obra-prima: "Clássico é clássico e vice-versa". Jardel provavelmente estava bêbado, mas tinha razão. Vamos subir juntos a escada do conhecimento e perceber o alcance deste pedaço de sabedoria gourmet. Um clássico é mais imprevisível do que a trajectória de um avião de papel. Um clássico também pode ser mais injusto do que um juiz-desembargador ou mais inclinado do que o Estádio Nacional do Benfiquistão. O que um clássico raramente é, é extremamente desequilibrado como Pedro Guerra. E 99% das vezes um clássico é um jogo que faz história. Um duelo à parte, que marca toda uma época. Se em Maio, os Aliados estiverem a abarrotar, garanto-vos que grande parte das conversas vai andar à volta da paradona épica de Casillas, da assistência de Gonçalo, do jogaço de Dalot, do falhanço (e do bom jogo) de Leão, do penalty sobre Doumbia ou da falta a meio-campo antes do golo do empate, da superioridade geral do Sporting e da eficácia do FC Porto. Foi uma bela homenagem à grandeza das duas equipas, um espectáculo bem condimentado, com emoção, sofrimento, injustiça, ansiedade, euforia e frustração. Infelizmente, levou Coentrão a mais. Mas um cagalhão só é bem-vindo no esgoto. Vamos a notas.



San Iker: Bendita a hora em que Sérgio Conceição se marimbou para o politicamente correcto e desfez a mudança que ele próprio promoveu. Sá é bom e tem tempo para ser melhor. No entanto, Casillas é o homem certo para o momento actual da época e ontem voltou a ser fundamental. Foi imprudente, Montero, quando tentou voar demasiado perto do sol. Foi imponente, Iker, a castigar a insolência do colombiano com o olhar que os comuns mortais merecem. É o preço que se paga por brincar com os deuses. Embora a equipa não tenha sido tão serena a defender como habitualmente acontece, foi Iker quem colou o nervo da defesa na hora do aperto. Seguro. Soberbo. Santo.

Dalot: Para primeiro clássico, não está nada mau. É difícil encontrar alguém tão novo com a maturidade tão apurada no futebol português. Sentiu algumas dificuldades em coordenar-se com os colegas da defesa por falta de rotina mas, no ataque, parecia conhecer Brahimi da primária. No lance com Doumbia, deixou-se vencer pela inexperiência. Embora não me pareça penalty, se fosse assinalado não me chocava. De resto, este a bom nível em todos os aspectos. Vai ser importante nos últimos quilómetros desta época e indiscutível na próxima.

Produtividade: Ao contrário do que li por aí, o FC Porto não foi menos produtivo do que costuma ser nos embates frente ao Sporting. Na verdade, o FC Porto criou mais uma oportunidade flagrante (5) do que a média dos confrontos anteriores contra o rival (4). Sucede que fomos mais assertivos a explorar os desequilíbrios abertos pelo balanço ofensivo do Sporting, sobretudo nos dois corredores, mais pragmáticos nas transições e acertámos menos vezes em Patrício, o que também ajuda. A ideia de que criámos menos mas marcámos mais é um mito, uma análise na diagonal extraída pela exibição menos conseguida.



Menos Porto: A verdade é que o FC Porto não fez um grande jogo. Não do ponto de vista estético, pelo menos. O Sporting, talvez porque tinha de assumir, foi mais agressivo na disputa pela segunda bola. Contudo, no Dragão, estou sempre à espera que o incentivo dado pela onda azul dê os centímetros que faltam para chegar primeiro. Só que desta vez não aconteceu. Sem bola, a equipa pareceu não ter ordens para pressionar alto e defendeu sempre com o bloco baixo, o que permitiu várias incursões aos jogadores do Sporting área adentro. O problema, julgo, esteve na abordagem ao jogo a meio-campo. No miolo mais suave do que o costume e em dois ou três dejá vus de experiências traumáticas do passado: as paragens cerebrais de Herrera e as parvoíces de Sérgio Oliveira, como a de tentar marcar um canto olímpico.

Corona: Horrível, como um elefante numa loja de espelhos. Virou uma data de bandejas de prata, sobejamente preparadinhas, com centros balísticos e passes antrofóbicos. A certa altura, nos mil contra-ataques em que podíamos ter matado o jogo, já havia um certo sentimento de decepção antecipada, de que se a bola chegasse a Corona a jogada iria afundar-se numa decisão absurda do mexicano.

Lesões: As putas das lesões. E sempre em dose de cavalo para dar uso ao estaleiro. Por este andar, vamos chegar a maio com o ginásio do Olival mais povoado do que o Fitness Hut a 2 de janeiro.

quinta-feira, 1 de março de 2018

R&C | Os números do FC Porto


Chamemos os números pelos nomes. O FC Porto apresentou ontem as contas do primeiro semestre e o resultado tem tanto de desconfortável quanto de expectável.

Os traços gerais vocês já sabem. Continuamos no vermelho, mas o prejuízo desagravou ligeiramente para cerca de 24 milhões de euros, contra os 29,5 milhões do período homólogo.


Na base desta melhoria está uma conjugação entre o aumento das receitas e a diminuição dos custos. Isto excluindo vendas de jogadores.

Que isto dizer que nos últimos seis meses de 2017, a SAD portista rentabilizou rubricas como a publicidade & sponsorização e averbou maiores receitas televisivas.

No caso da publicidade, não tendo havido nenhuma renegociação de contratos vigentes, o aumento deve-se às variações habituais que existem entre períodos. Já as receitas televisivas cresceram sobretudo devido ao calendário desportivo, pois entre junho e dezembro de 2017 jogámos mais um jogo em casa (9) do que em igual período do ano anterior (8).

Curiosamente, a coluna que fez verdadeiramente a diferença neste quadro foram as Outras Receitas Desportivas. Esta rubrica disparou quase 2,5 milhões de euros. E porquê? Por causa da presença na Supercopa Tecate, durante a pré-época.

Isto é particularmente assinalável porque podemos estar perante uma mudança de paradigma. As digressões intercontinentais, embora submetam as equipas a preparações por vezes deficientes e a um desgaste desnecessário, são uma boa fonte de rendimento para SADs com cada vez menos capacidade de financiamento, como é o caso dos três grandes. Desconfio de que vamos ver isto acontecer mais vezes nos próximos anos.

Continuo a não ser muito favorável a esta política, mas se o FC Porto for campeão este ano, não haverá muita gente a poder contrargumentar com o impacto desportivo que estas deslocações têm no arranque do campeonato. Lembrem-se que em 2016, polvos à parte, o Benfica também fez o mesmo e venceu o título nacional.


Estes proveitos compensaram a quebra das receitas nas competições europeias este ano. A SAD encaixou menos em 2017/18 porque perdeu mais um jogo na fase de grupos esta época e não passou pelo playoff (que o ano passado nos rendeu mais 2 milhões de euros extra).

Do lado da despesa, o destaque vai para o alívio de cerca de 3 milhões de euros da massa salarial com atletas, sobretudo no futebol. O desinvestimento é bem-vindo, estava preconizado e em linha com as directrizes do fair play financeiro imposto pela UEFA.

Ainda assim, confesso que esperava um valor mais assinalável aqui, tendo em conta o número de atletas que alienamos e colocámos esta temporada. Contudo, jogadores como Casillas, Maxi ou Brahimi, cuja saída no final da época é quase certa, vão representar um alívio bastante significativo da folha. E é bem possível que ainda estejamos a suportar parcialmente salários de jogadores como Bueno ou Ádrian López.


Um outro aspecto menos positivo foi o corte das remunerações de jogadores e técnicos não se ter traduzido propriamente na redução dos custos com pessoal. Porque a massa salarial da administração e dos funcionários do clube aumentou, seja através do salário (uma possibilidade, tendo em conta as pressões ascendentes da inflação), seja através do reforço dos quadros. No geral, a carga salarial da estrutura caiu apenas cerca de 1 milhão de euros para 38 milhões.

Os gastos com fornecimentos e serviços externos aumentaram cerca de 2,5 milhões de euros. Tenham em atenção que aqui não entram as comissões de transações de jogadores.

Aqui, o que aumentou foram os custos com serviços de prospeção de mercado e os custos com serviços de consultadoria jurídica e financeira. Também se verificou um aumento das despesas de produção do Porto Canal.


Isto estará provavelmente relacionado com a denúncia dos emails, que o FC Porto tem levado a cabo no canal e que terá certamente intensificado o aconselhamento jurídico no clube. A alçada do FFP também poderá ter movimentado mais serviços de consultadoria financeira, mas aqui estou apenas em terreno especulativo.

Resumindo e baralhando, os proveitos operacionais aumentaram ligeiramente, mas os custos também, o que significa que aqui ainda há muito trabalho a fazer para queimar gorduras. A redução do prejuízo esteve portanto concentrada nas transações de jogadores, tema que abordarei no próximo post.

Se houver, que isto comigo nunca se sabe.