segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Rio Ave 1 x 2 FC Porto | Trivelas & Roscas



Passaram sensivelmente 100 dias desde que Sérgio Conceição pôs o azul no branco com Pinto da Costa e decidiu sair da zona de conforto francesa para ousar uma aventura no cemitério de treinadores da Invicta. Se em junho recebesse uma visita do Drax de setembro para me dizer que íamos chegar à sétima jornada com o pleno de vitórias, 14 golos marcados e apenas um sofrido, pediria encarecidamente ao meu “eu” do futuro que abandonasse o vinho, pois nem nas minhas projeções mais quiméricas estava à espera de números tão requintados. E, acreditem, eu sonho todos os anos com um cenário onde o FC Porto conquista a Liga dos Campeões com um 5-4 ao Real Madrid, depois de estar a perder 0-4 ao intervalo. Mas a verdade é que cá estamos, em setembro, na liderança, com o máximo possível de pontos conquistados no campeonato, com a melhor defesa da Europa, o segundo melhor ataque em Portugal e já com três cabeças de borrego à cintura, numa prova inequívoca de que estamos vivos e prontos para não dar descanso a ninguém, apesar de termos um plantel menos talentoso e completo do que os rivais. O que vou dizer a seguir pode parecer uma perspetiva resultadista, e é, mas define aquilo que pode ser a chave da matriz ganhadora do FC Porto em muitas das deslocações mais perigosas desta época: o Rio Ave dominou, mas o FC Porto materializou. No final, o que contam são elas lá dentro.



Danilo Pereira: Voltou. Depois de um arranque de temporada intermitente, o trinco que mais me enche as medidas desde o fim do mandato do Polvo regressou à velha forma fazendo uma exibição absolutamente soberba, na forma como contribuiu para suster a linha média do Rio Ave o mais atrás possível, impedindo a construção do adversário em toda (toda!) a largura. Além do golo, o comendador foi essencial para que a estratégia de “jogar sem bola” montada por Sérgio Conceição, dando amplitude ao jogo e assegurando que os dois homens do meio-campo vila-condense produzissem o mínimo possível. Garanto-vos que não sou do clã Carreira, embora isto pareça plágio, uma vez que esta crónica foi escrita depois de ter lido as do Tribunal do Dragão, do Porto Universal, do Porta 19, etc. Qualquer semelhança com os demais é pura coincidência. Ou então é simplesmente a consequência natural de todos termos visto o mesmo jogo.

Brahimi: Começa a ser um padrão inegável. Quando o FC Porto actua em campos curtos, Brahimi destaca-se. Com mais ou menos objectividade, empurra a equipa para a frente e, mais importante, acaba por injectar na equipa uma confiança decisiva nos momentos cruciais. Exemplo disso foi a convicção que emprestou à cavalgada meio atabalhoada de Marega, o que fez com que o maliano não desistisse do lance e aparecesse para o finalizar. Jorge Bertocchini, autor do Porta 19, tem uma tirada sublime sobre isto, que recupero aqui para ilustrar melhor aquilo que quero dizer. Disse o Jorge, no rescaldo do FC Porto x Besiktas, que Brahimi “espetou pregos numa parede sem que ninguém pendurasse um quadro que se visse”. Uma expressão que resume na perfeição o papel actual do argelino do argelino no FC Porto. Está menos artista e mais curador. Só precisa que um dos matulões do ataque o ajude a pendurar os quadros. Foi o que fez Marega. Assim se conquistam três pontos.

Marega: “Guarda o que não presta e terás o que te faz falta”. Isto foi o que meu avô me respondeu um dia, quando lhe perguntei porque raio é que estava a apanhar um parafuso torcido e enferrujado do chão. O velhote era um hoarder de primeira a quem nós, antes dos anglicismos tomarem conta da língua portuguesa, apelidávamos carinhosamente de “sucateiro”. Sérgio Conceição podia ter abdicado de Marega. Mesmo depois do pequeno episódio do início de época. Era o mais fácil. Mas ainda assim, o treinador portista, contra a corrente dominante de pensamento na qual me incluo, guardou o parafuso. Marega é o principal retrato de um plantel recauchutado. Não é que o maliano seja, ou possa vir a ser, o principal alicerce em que vão assentar todos os sucessos que o FC Porto pode acumular esta época. Acredito até que, com a evolução natural da temporada, a sua preponderância se possa desvanecer um pouco, em função do que Soares pode dar à equipa. No entanto, tem dado jeito, muito jeito. É desonesto fechar a porta a essa evidência. O Moussa que ainda nos embaraça com recepções piores do que uma residencial na Cova da Moura é o mesmo Moussa que por vezes leva tudo à frente -- e a equipa em bloco, às costas -- como se estivesse a desembarcar de carabina na mão na Normandia. Por isso, não há margem para crítica. Quem dá o que tem, a mais não é obrigado. Talvez seja melhor direccionar a crítica a quem contribuiu para que o actual barómetro de qualidade do FC Porto seja Marega e não um Falcão ou um Jardel. Puxando a memória atrás, tenho a certeza que o meu avô arranjou finalidade para aquele parafuso, tal como Sérgio Conceição o fez para as características do maliano. Não posso pedir mais.

Borrego no saco: A deslocação de um ombro, de um joelho ou de um pulso podem ser chatas, mas nenhuma é tão incómoda como a deslocação ao Estádio dos Arcos para o FC Porto. Já são nove pontos ganhos em campos extremamente difíceis. Um dado que pode dar um impulso extra na segunda metade do campeonato, onde, neste capítulo, o calendário é bem mais acessível.



Otávio: Houve uma fase em que cheguei a pensar que Otávio estava em sub-rendimento. Agora, tendo mais a considerar que o início da época passada é que foi um pico anormal na forma do jogador brasileiro. Otávio parece desligado dos processos da equipa. Amorfo e desconcentrado, continua a não compreender o seu papel em campo, mesmo quando o mesmo é claro. Não fosse Sérgio Conceição o treinador que lhe deu o banho mais eficaz de cultura táctica quando aterrou em Portugal, diria que o problema estava na orientação. Mas não está. A rever.

Meio-campo sem Óliver: Apostar numa estratégia sem Óliver é compreensível. Herrera dá (e deu) muita coisa ao jogo que o espanhol não oferece, mas sem Óliver, o FC Porto foi controlado no miolo, praticamente do início ao fim, onde só a transcendência de Danilo evitou maiores desequilíbrios. Sérgio arriscou e saiu-se bem. Esta foi também uma mensagem de confiança ao mexicano, que, com o nervo no lugar, pode ser mais solução do que problema. Mas era importante que a SAD priorizasse desde já um ataque preciso e contundente ao mercado de inverno que trouxesse uma alternativa credível ao espanhol. Porque Oliver não é apenas o nosso elemento mais criativo, é também o único.

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