segunda-feira, 21 de setembro de 2015

A mística e o mítico

A próxima pergunta é para todos. Dos 8 aos 80. Quem é que nunca percorreu o corredor de sua casa imaginando que estava a jogar com a camisola do FC Porto em pleno jogo do título?

Quem nunca simulou um drible diabólico e imparável até chegar à porta do quarto, antes de rematar uma bola invisível a uma baliza inexistente, entrando noutra divisão da casa de punho cerrado no ar e a celebrar o golo que nunca aconteceu?

Aldrabões.

Até eu ainda faço isso.

Faz parte do imaginário do mais comum dos adeptos projetar-se no palco dos sonhos com a camisola do respectivo clube. Todos fantasiamos, pelo menos um dia das nossas vidas, em ter menos 10 cm de pança, um six-pack na barriga ao invés de no frigorífico, capacidade técnica suficiente para partir os rins ao Luisão e um estádio de pé a gritar o nosso nome.

Não o fazemos por egocentrismo, mas pelo desejo de ver essa imagem mental materializada na próxima partida do nosso clube, talvez com o nosso jogador preferido do plantel.

Ontem, André André cumpriu esse sonho. O do adepto que dá a vitória mais importante de época ao seu clube. E no sonho cumprido de André André, todos nós cumprimos um bocadinho do nosso. Eu corri como um insano pela casa, depois de ter assassinado a mesa da sala. Acredito que alguns de vocês, também . Mesmo os que tiveram o privilégio de gritar golo naquele majestoso covil do Dragão ter-se-ão lançado numa desenfreada corrida mental para abraçar o André júnior e partilhar com ele a explosão de alegria que nos ofereceu.

Magia não existe. No sentido lato, é outra figura do nosso imaginário. Mas se algum dia houve alguma coisa mais próxima de magia neste universo dominado pelas leis da física, essa coisa é a mística. A mística não se explica. É expontânea. Existe. Multiplica o querer e a vontade. Transforma gatos em leopardos. A mística é intangível, mas viva. Está lá. Esteve sempre lá. Naquele renovado balneário de campeões. Andava meio adormecida. O pontapé de André André despertou-a.

Porque havia, e contra mim falo, quem começasse a questionar a cultura portista de um balneário cada vez mais plural e menos português (até este ano). Uma dúvida legítima que levantou uma questão exasutivamente repetida: onde está o nosso ADN? Perguntámo-lo aos jogadores, aos treinadores e até à estrutura. André André deu-nos ontem a resposta.

Ganhar ao Benfica não é objetivo, é imperativo. Nem sempre vai acontecer e isso é perfeitamente normal. Mas igualmente imperativo é nunca desistir de o tentar. Nunca se resignar.

André André mal conseguia falar na flash-interview. Pudera, uma grande fatia daquela alma ainda estava no campo, à procura do Samaris e a morder os tornozelos ao André Almeida, não fosse Artur Soares Dias ainda não ter acabado o jogo. André André fez um sprint de 25 metros aos 86', quando já tinha quase uma mini-maratona nas pernas, tendo ainda o discernimento de concluir com frieza aquela que era, provavelmente, a última oportunidade de golo do FC Porto naquele jogo.

Mística não é beijar o emblema. Longe disso. É sentir aquele brasão colado ao peito e colocar a vitória à frente da vida. É um sacrifício enorme, eu sei. Mas é precisamente por isso que nem todos a carregam. O filho do eterno António André explicou -- finalmente -- ao restante balneário o que é o FC Porto. André André. Eis a mística que faltava.


Umas milhas mais a sul, há uma nova atracção no freakshow do futebol televisivo português. Chama-se Augusto Inácio, diz-se que é o diplomata do Sporting, mas teve de arranjar um part-time na SIC Notícias, dada a falta de matéria de cariz internacional do seu clube.

O ex-pensador do futebol do Sporting, despromovido com a chegada do profeta à Mecca dos viscondes, viu-se forçado a procurar outras formas de agradar ao patrão, oferecendo-se para ir à televisão pregar a cartilha.

O que Inácio diz sobre a sua agremiação e os respectivos jogadores e dissidentes é com ele. Já toda a gente percebeu porque é que este lacaio de Bruno de Carvalho foi estrategicamente colocado onde foi.

O que é assombroso é o deslumbramento de Inácio, que leva o título de "responsável de assuntos externos" demasiado à letra. Externos do clube, Inácio, não externos ao clube. O FC Porto deve três meses de salário ao Rolando, guru? Leste isso no suplmento Vidas do Correio da Manhã? Ou terá sido na Antena 2 colombiana? Dois conselhos para ti, tradutor: começar a consultar com maior frequência o regulamento de transferências da FIFA antes de vomitar o que o teu presidente manda; ouvir a Antena 2 lusa, acredita que é bem melhor e mais plácida.

Não vale a pena insistires no deusismo. Volta para o escritório, vai a concentrações de Sportings de várias cidade do mundo, mas deixa de pressionar publicamente Carrillo a renovar. É feio. E, recuperando Rolando, nunca foi estratégia que resultasse. Nunca te julguei propriamente inteligente -- tens ar de lambe-botas de primeiro grau --, mas ver-te transformado em marioneta, a poluir ainda mais a já decrépita televisão portuguesa, é patético. Sobretudo quando nem sabes do que falas. Especialistas em verborreias existem aos montes. Tu arriscas-te a superar alguns deles. E olha que é difícil.

Deixa-te disso, mítico.

6 comentários :

  1. Nunca! http://atascadosilva.blogspot.pt/2015/06/enjoy-silence.html ;)

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    1. Bravo, bravo, bravo!

      Só te descobri há um par de meses. Falhei esta história.

      Fucking amazing. Faz-me tanto lembrar-me os tempos de jogador de corredor, onde a única coisa que havia para fintar era jarras e jarrões. E eu que metia o pé mesmo em cima dos artefactos, sempre a arriscar uma sensação pesada da UEFA lá de casa, leia-se, mãe.

      Que tempos!

      Abraço, Silva.

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  2. É isso mesmo, caro Drax.

    A esperança do velho bom Porto renasceu com André, Rúben e mais alguma companhia. Não têm que ser todos "nossos", basta alguns para contagiar os outros, os de fora.

    Que possa(m) continuar por alguns anos e ter tempo para entretanto passar a tocha a novas fornadas.

    E que sejam considerados desde já Património Imaterial do Portisto, a salvo de qualquer treinador eou director talibã que por cá possa aparecer.

    Já os comemos, carago!

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    1. Foi um dupla vitória ontem. Sobre eles e sobre nós próprios. Temos embaixadores de peso naquele balneário.

      Forte abraço, Lápis!

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  3. @ drax

    b-r-a-v-o!
    brilhante, como sempre.

    resposta à pergunta inicial:
    só quem já não tem a criança, que sempre foi, dentro de si, é que não se imagina herói por um dia. o meu pikachu que o diga, quando lhe roubo a bola por breves momentos ;)

    abr@ço forte
    Miguel | Tomo III

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    1. Sonhar ainda é das melhores coisas do mundo.

      Obrigado, Miguel!

      Grande abraço, amigo.

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