segunda-feira, 28 de setembro de 2015

1893

Mil oito noventa e três.

O timbre dos algarismos ecoa repetidamente na mente.

Carregam o poder de me despertar da letargia em que me encontro.

Faça chuva, vento ou uma improvável tempestade de areia à George Milller, sorrio.

Nada é eterno. Nem o meu FC Porto. Extinguir-se-á um dia, mesmo que resista até ao fim dos tempos, quando o sol desistir de pulsar.

Afugento estes demónios existenciais de pensar no futuro após o futuro. Foco-me no presente.

Recupero uma antologia antiga da prateleira. Assenta-lhe bem a poeira. Confere-lhe peso. Quase me sinto indigno de tirar aquela capa empedernida do repouso secular.

1893, lê-se.

O ano em que se "apurou um grupo rijo de jogadores para medir-se contra os clubmen de Lisboa".

Raça que se perpetuaria no tempo, afrontando a tão humana mortalidade.

Invade-me uma profusão de sentimentos. Ali entre o orgulho e a nostalgia. Recordo mil golos, vitórias para lá do que é possível contar.

Resgato fotogramas encravados na memória sideral. Onde nem licença tenho para entrar voluntariamente.

Deixo o subconsciente apoderar-se de mim e gozar aquele momento. Folheio páginas que sei de cor, que leio antes de os meus olhos abraçarem as palavras.

É um livro velho, comprado num alfarrabista septuagenário ou esquecido no meio de uma herança qualquer.

São as minhas Teses de Abril. A minha Bíblia. O meu Conto de Duas Cidades, a minha e a do meu coração.

Cravejado de defeitos e feitios difíceis. Estórias mal contadas, histórias bem adornadas. Sucessos, acima de tudo, sucessos. A quintessência do meu FC Porto desdobrada em signos, palavras e epígrafes que marcaram o seu passado.

Deixo-me envolver.

Rendo-me a um passado de honra e de luta que pagava para viver. Sinto o aroma do couro gasto que não existe. Na verdade, é mais uma armadilha do cérebro. Amante de uma cultura tão própria.

Nobre, diferente, invicta. Acima de tudo, nossa. Entrego-me ao sentimento de pertença e a tudo o que ele encerra.

Recordo o anteontem, o ontem e prenuncio o amanhã. Penso no quanto me alegras, irritas e no quanto anseio ver-te de novo. Uma e outra vez.

Podes fazer-me sofrer como nunca.

Mas eu vou estar cá sempre.

Parabéns.


sábado, 26 de setembro de 2015

MFC 2 x 2 FC Porto: Estranha forma de vida

À hora a que vos escrevo esta análise ainda sinto a alma vazia. Já não são nervos, mas decepção. Tento encontrar a melhor forma de descrever o que aconteceu em Moreira de Cónegos, não consigo. Julgo que o texto de hoje vai acompanhar a mediocridade da equipa de ontem. Mas ao contrário deste FC Porto de Lopetegui não vou andar a dar voltas ao relvado para chegar onde quero. Vou optar por por uma solução mais directa e eficaz de diagnosticar o problema. Precisamente o que os dragões deviam ter feito ontem.

O clássico não mentiu. Os momentos de brilho deste FC Porto escondem sérios problemas. Daqueles que comprometem mais do que apenas um jogo. No Comendador, não é a primeira parte cinzenta ou a falta de criação que preocupa. Estávamos cientes das dificuldades desta partida e só por muita ingenuidade alguém poderia pensar que este jogo se tornaria fácil. O mar de sofrimento era expectável. Até por estar ensanduichado entre dois dos encontros mais importantes da temporada: Benfica e Chelsea. Não, o que faz arrancar cabelo é a alma quebradiça destes jogadores.

O FC Porto 2015/16 tem duas condições do que começam a espoletar imensa comichão nos adeptos: sonolência e tremedeira, sobretudo fora de casa. Mas se a primeira é apanágio deste dragão quando se apanha a vencer e já sucedia, em maior ou menor grau, com outros treinadores ao leme, a segunda é uma novidade aterradora, que só estava habituado a ver noutras paragens. É inconcebível que uma equipa como a nossa, depois de fazer tudo e tudo fazer para chegar finalmente ao 1-2, se tenha diminuído perante um Moreirense. Mas desde quando? De onde herdámos esta súbita ansiedade? Onde pára aquele FC Porto que não deixava fugir vitórias? Perturbador.

A inoperância desta equipa chega a atingir níveis incompreensíveis, sobretudo porque a mesma já nos mostrou que pode fazer bem, mas bem melhor. Isto já não é fado. É culpa própria.


MAIS
André André: Foi dos poucos que foi transportando com sucesso a equipa para a frente. Faltou-lhe Imbula no apoio, uma vez que Herrera passou ao lado do jogo. Inconformado de sangue, André André foi preponderante no assalto ao segundo golo e voltou a vincar, uma vez mais, a importância de ter um jogador de combate no onze. Não sendo criativo nato, André André mostra dificuldades a decidir rápido, sobretudo em espaços curtos e sobrepovoados, como foi ontem a linha média do Moreirense, que plantou quatro homens no meio-campo. Contudo, o jogo do FC Porto tem passado cada vez mais por ele e pelas suas acções transversais em campo. É o pêndulo da equipa, garantidamente.

Maicon da primeira parte: Eficaz a defender e forte no passe longo. Esteve atento, concentrado, sem disparatar e ainda mostrou aos companheiros o segredo para bater aquele que é, sinceramente, um dos guarda-redes mais frágeis da primeira Liga: rematando. Excelente golo de livre directo, que demonstra treino e empenho do jogador em trabalhar esse capítulo. Quase apetece dizer que Maicon é o único que aparece na cadeira de Bolas Paradas, pois foi igualmente de uma cabeçada sua que saiu primeiro lance de perigo através de um canto que o FC Porto produziu em meses.

Casillas: Fez o que podia ter feito. Adiou o que começava a parecer inevitável até onde foi possível. Mas quando um tanque como André Fontes lhe surge, sem marcação e com embalo, apenas dois metros à sua frente, é desonesto pedir-lhe mais. É um redes de craveira mundial e tem-no provado desde que chegou ao FC Porto. Foi um dos que sacudiu males maiores ao FC Porto no clássico e, ontem, pela sua cara depois da partida, deve ter sacudido aquele balneário no final dos 90'. Com razão.

Danilo: Boa presença física e sempre muito disponível no seu raio de acção, foi eficiente na contenção a Gomes e Battaglia, que minaram sempre o seu território e não lhe permitiram grandes incursões no ataque continuado.


MENOS
Herrera: Era capaz de jurar que ouvi Job a gritar com ele ontem. Herrera é exasperante. É fácil perder a paciência com o mexicano. Porque não estamos a falar de um tipo que foi convidado à última da hora para fazer uma perninha no Moreirense x FC Porto. É um profissional de milhões. E para os milhões de que estamos a falar, a forma como erra passes simplicíssimos, falha recepções básicas e demora a executar é inaceitável. Passou uma hora a navegar na maionese, parecendo mais preocupado com a infinitude do universo do que em pressionar o adversário e em não deixar fugir Battaglia. Confesso que antevi isto tudo aos cinco minutos, quando o mexicano desperdiçou um dos centros mais fáceis da sua carreira e que tinha tudo para acabar na cabeça de Osvaldo. Herrera não sabe lidar com os próprios erros. E creio que nunca se libertará disso. Neste momento, é apenas mais um jogador do plantel, o que faz dele um jogador a mais.

Lopetegui: Há uma razão para um plantel ter 25 elementos e não apenas 11. A rotação promovida por Lopetegui era necessária e não me pareceu exagerada. Dada a carga física dos dois jogos que balizavam este encontro, era importante fazer descansar alguns dos jogadores mais expostos ao esforço. Não é por aí. O problema é a incoerência do técnico basco na leitura que aplica ao jogo em partidas diferentes. O mesmo treinador que tirou Varela antes do intervalo contra o Estoril, manteve um Herrera bem pior em campo durante cerca de uma hora. A verticalidade do mexicano é incompatível com espaços demasiado exíguos e pouco terreno para correr. Lopetegui sabia disso. Ainda assim, preteriu de Evandro, Sérgio e até Bueno na convocatória. Depois, voltou a insistir em alterações posicionais que partem a equipa. Nos últimos 180 minutos, o FC Porto apresentou quatro desenhos tácticos diferentes. Colocar a carne toda no assador a vinte minutos do fim deu frutos. Mas este FC Porto está programado para reagir e não para agir, o que por si só é um mau princípio. Pede-se mais, Lope. E tu tens capacidade para isso.

Maicon da segunda parte: A concentração e assertividade do brasileiro ficaram na cabine ao intervalo. O golo de Iuri nasce de uma triangulação do Moreirense só possível pela precipitação de Maicon, que ataca o espaço vazio e convida o avançado português ao sprint. Líder dentro de campo, Maicon deve ser a voz que equipa precisa quando procura tranquilidade e não um exemplo desse mesmo nervosismo. Acabou por se afundar lentamente no mar de mediocridade da equipa e a lesão também não ajudou, forçando-o a fazer os últimos dez minutos em esforço.


Momento: Minuto 84'. Maxi alivia uma bola para as couves. Minto. Devidamente corrigido pelo SilvaAboubakar isola Osvaldo com um belíssimo passe, com o italo-argentino a atirar de pronto para uma baliza deserta, sem Stefanovic. Seria golo se André Micael tivesse desistido do lance. Um pormenor que mudaria tudo. Mas que não explica nada. É eufemismo apontar a culpa do resultado ao triste fado ou à embirração do destino com o FC Porto. Cabia-nos fazer muito mais do que esperar que bolas pingadas na área dessem descanso. Fomos nós quem descansámos após o primeiro golo e nunca mais vivemos descansados depois do segundo. Outro FC Porto, que não este, impediria que o nervo se instalasse na recta final. Mas fomos pequenos precisamente quando urgia que nos agigantássemos. 


Pormenor: Já não consigo perceber se o abalo sísmico de Kelvin aos 92' foi uma benção ou uma maldição. Ou ambas. É que desde essa noite memorável como nenhuma outra, o FC Porto nunca mais voltou a marcar em cima ou para lá dos noventa, oferecendo-nos uma daquelas vitórias que parece ter sido salva de um avião segundos antes deste se despenhar. Daquelas que valem campeonatos. Digo isto porque senti, logo após o 2-2 aos 87', que o resultado estava feito. E ainda me lembro dos tempos em que havia esperança noutro desfecho. Em que sobrava sempre mais um sopro de vida para conquistar a vitória. Este FC Porto reage mal a resultados adversos. E, ontem, até foi alérgico à vantagem.

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Depois da vitória no clássico, era importante dar continuidade à senda, até porque o este dragão tinha o hábito de cravar as garras na liderança. Não aconteceu e vamos, certamente, cedê-la hoje.


Lopetegui tem muito trabalho pela frente, sobretudo pedagógico. Este plantel do FC Porto possui em potencial o que tem em fragilidade. Se Lopetegui não for cola para unir os cacos, vamos ver o FC Porto perder mais pontos fora de casa. Todos os medos são progressivos. Crescem e diminuem conforme as experiências que vivenciamos com eles. E chegaremos à conclusão que somos o nosso maior receio.

Vamos ter mais de um mês para preparar novo embate contra este recém-criado fantasma. Só voltaremos a sair de casa a 31 de Outubro, na deslocação à Madeira, para defrontar a União. Cabe ao treinador capitalizar esse tempo. É fundamental mostrar-nos a nós próprios que o dragão não é raquítico.

Estranha forma de vida tem este meu FC Porto.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Armadura sem carimbo

A camisola 2015/2016 do FC Porto continua de proa vazia.

Atípico, sobretudo para uma modalidade onde tudo é cada vez mais comercializável. Mas não propriamente preocupante.

A falta de patrocínio é, para já, mais problemático para quem quer patrocinar do que para quem quer ser patrocinado.

Do ponto de vista do clube, já se cumpriu uma boa parte do orçamento através dos proveitos operacionais obtidos na época passada, para os quais contribuiu a excelente prestação global da equipa na Liga dos Campeões, aos quais se junta o recorde de receitas com vendas de jogadores, que só em 2015 ultrapassaram a barreira dos 100 milhões.

Do ponto de vista de um patrocinador, já se perdeu uma oportunidade de exposição na maior montra mediática do futebol mundial -- jogo da Champions -- e há obuses de marketing como Iker Casillas ou Dani Osvaldo para disparar.

O tempo corre a favor dos dragões. Disse-o, há uns tempos, nesta análise do Porto Universal ao assunto: se o FC Porto, coleccionador de títulos e recordista de presenças na liga milionária não fosse um fruto apetecível às marcas, o que seria?

Reconheço que, quando vejo esta turma entrar em campo sem carimbo na armadura, não escondo uma certa satisfação por isso. A camisola imaculada do ferrete corporativo agrada-me. Vê-los passear aquele tecido puramente azul-e-branco no relvado é uma quase homenagem à memória de outras décadas.

No entanto, sponsor é um palavrão necessário para a tesouraria. Mais dia menos dia, aparecerá.


Sendo o segredo a alma do negócio, o nome do próximo patrocinador vai permanecer na sombra até o FC Porto alcançar um acordo com um novo parceiro. Enquanto isso não acontece, interessa fazer o balanço da situação, formulando as extrapolações possíveis. Isto para clarificar também alguns pontos que, noto, têm levantado certas interrogações na assembleia virtual portista.

Um alerta. Não visa este post especular sobre nada em concreto, até porque o Do Calcanhar à Trivela está longe de ser um fontanário. O objectivo é somente enquadrar os rumores actuais nos factos existentes. Para o exercício que se segue, juntei os retalhos mais ou menos fundamentados que se foram dando a conhecer nestas últimas semanas e usei-os para tecer algumas conclusões preliminares.

Vamos a elas:

NOVO BANCO: 
Ou banco "bom" para os amigos. Surge da insolvência e divisão do antigo Banco Espírito Santo em duas partes. Foi um dos primeiros nomes ventilados em alguns círculos, pela ligação umbilical dos clubes portugueses à banca, mas nunca foi -- em boa verdade -- uma opção considerada. Embora seja promovido como a biblioteca de activos saudáveis resultantes da triagem feita à "Salganhada" que ia no BES, o Novo Banco é na verdade um banco de transição, à procura de um comprador que o recapitalize o mais rapidamente possível. A instituição, agora na posse do Banco de Portugal e sustentada pelo Fundo de Resolução, foi alvo de um rebranding instantâneo e barato, que mais não serviu do que para lavar a cara das acções dos anteriores donos. Uma espécie de duche rápido para ficar cheiroso aos antigos clientes e... a novos investidores. Isto leva-nos à Fosun.

FOSUN: 
A hipótese Novo Banco existia, mas não através da marca Novo Banco em si. Ou seja, apenas a venda da instituição ao grupo chinês de investimento Fosun International abriria a possibilidade de o FC Porto ser patrocinado pela nova face de um banco a precisar de projecção para crescer no mercado nacional. Mas essa operação não se concretizou. No início deste mês, a Fosun entrou em conversações com vista à aquisição do Novo Banco, mas o Banco de Portugal considerou a proposta chinesa insuficiente, tendo abortado o negócio. Isto já depois de goradas as negociações com a Anbang, outro conglomerado chinês, também por falta de acordo entre regulador e candidato. Ora, a Fosun tem-se mostrado extremamente agressivo no mercado ocidental e já anunciou a intenção de ingressar em vários sectores do mercado além da banca. Por norma, a Fosun não perde muito tempo com partos difíceis. Para já, parece ter desistido da banca portuguesa. Além disso, o Banco de Portugal já anunciou que só retomará o processo de venda do Novo Banco a partir de 2016. Por isso, e pelo estado do restante sector bancário em Portugal, dificilmente o próximo patrocinador do FC Porto será uma instituição financeira.

SAMSUNG: 
A gigante tecnológica sul-coreana já é um dos principais parceiros do FC Porto. Tem uma série de parcerias com o clube e vai aparecendo cada vez mais destacada nos eventos dos dragões. No último clássico, aproveitou o palco do Dragão para estrear uma tecnologia pioneira de transmissão dos jogos de futebol em realidade virtual. A própria marca parece estar a estreitar laços com a cidade, tendo reforçado a aposta no Grande Porto com a abertura de duas novas lojas em Maio deste ano. Curiosamente, foi no mais circunscrito circuito das redes sociais portistas que o rumor ganhou força, tendo sido inclusive suportado por alguns dos gurus do insidismo. Vale o que vale. O facto é que a relação entre a Samsung e o FC Porto está a crescer e a empresa sul-coreana está no meio de uma frenética space race contra a californiana Apple pela hegemonia do sector dos smartphones, apostando em força na publicidade. Iker Casillas, por exemplo, foi uma das caras da Samsung nos últimos anos. Nota ainda para uma outra situação que pode ser determinante neste cenário. A Samsung terminou este ano o milionário contrato de sponsorship que a ligava ao Chelsea (ao qual pagava cerca de €21 milhões por temporada), agora apadrinhado pela Yokohama. Perdeu o big fish publicitário e principal bandeira desportiva da marca dos últimos anos, mas ficou mais financeiramente mais disponível para investir. Um último dado, talvez menos perceptível mas relativamente importante: a proximidade estética entre as marcas FC Porto e Samsung. Ambas têm no azul um símbolo, o que facilita desde logo o matrimónio de cores na t-shirt principal. Pormenores que não decidem, mas pesam.

QATAR AIRWAYS: 
As companhias aéreas do Golfo Pérsico quebraram a barreira do som no mercado do futebol e contagiam cada vez mais camisolas dos grandes emblemas europeus. Um dia destes, as meias-finais da Liga dos Campeões vão parecer uma feira de transportadoras de luxo. Depois de a Fly Emirates se ter associado ao Benfica, a Qatar Airways foi apontada ao Sporting. O que faz sentido. A empresa catari vai abrir este ano a primeira rota directa para Lisboa. E ao contrário do que diz a hashtag, o Sporting continua a ser de Lisboa. Assumindo que o interesse fosse real, a saída do clube da Champions poderá ter comprometido o negócio. Ainda sem presença efectiva em território nacional, é sobretudo projecção internacional que esta corporação pretende no imediato. Não estou a ver a Qatar Airways preocupada em deixar pegada em Tondela ou Moreira de Cónegos, sem desprimor. Ontem, alguns burburinhos viraram a agulha da empresa para o FC Porto. É certo que a nossa dimensão internacional é incomparavelmente maior do que o valor que nos dão cá dentro. O FC Porto vende melhor lá fora, sobretudo nos países da América Latina (em particular a Colômbia) e agora no México. Mas, a menos que a estratégia da Qatar Airways seja apenas capitalizar essa amplitude transcontinental do clube e a presença regular na prova milionária, não vejo onde cabe essa uma eventual união entre as duas partes. E, para isso, já existe o Barcelona. Doha/Porto parece-me, por ora, uma ligação ainda longe de acontecer.

BUZZTRADE: 
Este é provavelmente o buzz mais bizzarro deles todos. Perdoem-me a aliteração. A Buzztrade.com apresenta-se como uma plataforma de transacção de produtos financeiros de risco aparentemente normal. Logo na página principal, escarrapacha uma imagem do FC Porto 2015/2016, ao mesmo tempo que se anuncia como parceira oficial do clube. Eu, que até trabalho numa área relacionada com mercados cambiais, nunca vi a Buzztrade mais gorda. Ainda tentei pesquisar sobre ela no google, mas o domínio parece ainda nem estar indexado ao motor de busca. Uma rápida consulta ao About do site permite-nos saber que se trata de uma corretora cipriota, fundada este ano, filial de uma tal de YTFTrade Ltd, outra corretora sediada no Chipre. Aposto que a casa-mãe destas empresas se chama AZVKzxbs%&-xLttY ou algo do género. Confesso, não tive paciência para continuar a escavar mais, senão ainda acabaria na Deep Web. A presença social da Buzztrade é quase nula: facebook com pouco menos de um mês e um twitter onde segue apenas uma conta, a do FC Porto. Tentei falar com a assistência técnica, mas não obtive resposta. Descobri, em alguns fóruns portistas, quem aparentemente tenha conseguido e sabido que a empresa não confirma se será a estampa da camisola do clube este ano, mas que haverá uma conferência de imprensa a anunciar a parceria na próxima semana. Odd. Opaco e pouco esclarecedor. No entanto, não me surpreenderia se isso acontecesse. As corretoras parecem estar a dar os primeiros passos neste mercado e há cada vez mais pessoas a negociar instrumentos financeiros de risco. É um pouco como o fenómeno das apostas. A título de exemplo, o Atlético de Madrid é patrocinado por uma outra corretora, essa bem mais renomada, a Plus500. É provável que exista de facto uma parceria da Buzztrade com o FC Porto na forja, mas tenho dúvidas de que seja este o nosso novo patrocinador principal, quanto mais não seja pela parca dimensão da plataforma.

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É possível que me tenha escapado algum rumor, mas assim de cabeça -- e de pesquisa, porque faço sempre o meu trabalho de casa -- penso que estejam aí compilados os mais consistentes até ao momento.

Em jeito de balanço final, e sem grandes prognósticos sobre tão delicada matéria, assumo que não tenho preferência, nem previsões sólidas sobre qual será o próximo patrocinador do FC Porto. Interessa-me, no geral, o que interessa ao grosso dos adeptos portistas: que seja apenas um negócio vantajoso e benéfico para o clube.

Se me perguntarem qual destes não será o próximo patrocinador do FC Porto, arrisco dizer com algum grau de certeza que a Fosun está descartada. Assim como, pelas razões já mencionadas, o Novo Banco. A linha dos factos joga a favor da Samsung. Mas podemos andar todos a bater ao lado, bem ao lado.

Afinal, o FC Porto nunca foi apenas emblema de títulos. É também um clube de grandes surpresas.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Um dia

Impostor.

Traste.

Gosma.

Rato.

Pirómano.

Bandalho.

Bárbaro.

Vice-traficante.

Energúmeno.

Imbecil.

Palonça.

Corja.

Javardo.

Eunuco.

Gomes da Silva.

Miserável.

Verme.

Sabujo.

Filho de puta.

...

Um dia, perco a cabeça e insulto-te.


terça-feira, 22 de setembro de 2015

Abraço de pedra

Helton e Casillas: Abraço de pedra

Enquanto deambulava pelas imagens da festa de domingo, tropecei neste momento poderoso. Uma fotografia que me deixou ancorado durante largos minutos.

O quadro, captado por um dedo cirúrgico, não deixa espaço à dúvida: esta época, o FC Porto joga com dois guarda-redes.

Era praticamente impossível prever as consequências que a contratação de uma supernova do futebol mundial como Iker Casillas comportaria sobre um dos maiores pesos-pesados dos dragões nos últimos anos, Helton Arruda.

Perspectivava-se um choque de titãs. Temia-se o paradoxo da omnipotência. Que o telhado fosse curto para dois egos astronómicos. Que o mediatismo de Casillas sentasse o simbolismo de Helton no banco. Que, no meio de tudo isto, a métrica fundamental para a titularidade passasse a ser o decreto em vez da qualidade.

Nem era por má fé.

   
Helton. 321 jogos pelo FC Porto.
Recorde-se o Helton do final da época passada. Uma bomba-relógio em tic-tac acelerado. Um tipo visivelmente saturado, com futuro incerto no clube, armado com uma retórica suspeita contra uns e recados mal encriptados para outros. O guardião brasileiro foi o espelho das atribulações que marcaram a recta final da temporada transacta e nunca se escudou de responsabilizar -- directa ou indirectamente -- o treinador por isso.

Tanto que a sua renovação surpreendeu alguns quadrantes, que já esperavam que a rota de colisão iminente entre o jogador e Lopetegui cumprisse a trajectória. Mas a bomba não explodiu.

Depois, Casillas parecia querer fugir de Madrid como quem ansiava escapar da prisão. Da cidade, do país e do clube, onde já só mantinha uma aura ténue por força dos 25 anos de blanco. O guarda-redes fora finalmente vencido pela enorme pressão da imprensa espanhola, que não é mais do que uma alcateia de hienas sedentas pelo próximo erro de Iker. Os jornais nunca viveram das boas notícias.

Porém, a chegada de Casillas ao FC Porto não foi o gatilho do caos preconizado.

Em parte, porque Helton é enorme. Entre os postes e fora deles. O primeiro capitão estrangeiro da era Pinto da Costa não chegou à braçadeira por promoção automática. Fez por isso. Leva 321 jogos com esta camisola. O que dá qualquer coisa como 29.000 minutos, ou quase 500 horas, a guardar o templo. É muito, muito tempo. Teve os seus momentos negros, verdade. Contudo, também foi o farol deste emblema em incontáveis ocasiões.

Quando o internacional espanhol aterrou no Porto, Helton percebeu que lhe estava a ser endossada uma responsabilidade bem maior e mais exigente do que defender a baliza do FC Porto: defender o FC Porto. Proteger o grupo, o plantel, o balneário.

O brasileiro abraçou esse desafio. Entende-se melhor com o basco e consigo próprio. A pouco e pouco, torna-se no adjunto não-oficial de Lopetegui. O cordão umbilical entre o técnico e a equipa. Interventivo, inteligente, irrepreensível. O que envolve também transmitir confiança e afecto ao novo dono da baliza do FC Porto. Levantá-lo nos piores momentos. Erguê-lo nos melhores.

Iker. 725 jogos pelo Real Madrid.
Casillas também ajudou. De que maneira. O guardião mostrou que humildade e estrelato são duas palavras com o mesmo tamanho. Poderia ter feito como a maioria dos endeusados fazem sempre que descem do seu Olimpo para jogar noutras paragens. Aterrar em cima do piano, de estatuto na mão. Mas não. Olhem para a foto de domingo: é Casillas quem, no fundo, parece uma criança agarrada ao ídolo. Icónico.

Em Espanha, dizem-no frágil. Foda-se: é óbvio que é frágil. Espanha toldou-o assim. Tem uma câmara apontada a si durante 90 minutos de cada jogo. Tem um programa em horário nobre na televisão espanhola a registar cada arroto que dá. Tem colunas em revistas dedicadas a avaliar a sua performance a descascar camarão na marisqueira de Matosinhos. A comunicação social espanhola tem um sismógrafo a medir permanentemente a vida de Casillas. Diria até que possui os direitos de privacidade do jogador. Hediondo.

Se eu vivesse um autêntico Truman Show como este que Iker vive, acho que também questionaria a minha sanidade mental.

Podia ter havido resignação e amuo, em vez de respeito e admiração. Mas Helton e Casillas, dois monumentos vivos, comportaram-se como os ícones que efectivamente são. Monstros que conseguem coabitar no mesmo espaço.

O abraço entre ambos no final do clássico é sintomático. E mais um daqueles momentos em que o silêncio de uma fotografia nos diz tanto.

Um verdadeiro abraço de pedra.

Imortal.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

A mística e o mítico

A próxima pergunta é para todos. Dos 8 aos 80. Quem é que nunca percorreu o corredor de sua casa imaginando que estava a jogar com a camisola do FC Porto em pleno jogo do título?

Quem nunca simulou um drible diabólico e imparável até chegar à porta do quarto, antes de rematar uma bola invisível a uma baliza inexistente, entrando noutra divisão da casa de punho cerrado no ar e a celebrar o golo que nunca aconteceu?

Aldrabões.

Até eu ainda faço isso.

Faz parte do imaginário do mais comum dos adeptos projetar-se no palco dos sonhos com a camisola do respectivo clube. Todos fantasiamos, pelo menos um dia das nossas vidas, em ter menos 10 cm de pança, um six-pack na barriga ao invés de no frigorífico, capacidade técnica suficiente para partir os rins ao Luisão e um estádio de pé a gritar o nosso nome.

Não o fazemos por egocentrismo, mas pelo desejo de ver essa imagem mental materializada na próxima partida do nosso clube, talvez com o nosso jogador preferido do plantel.

Ontem, André André cumpriu esse sonho. O do adepto que dá a vitória mais importante de época ao seu clube. E no sonho cumprido de André André, todos nós cumprimos um bocadinho do nosso. Eu corri como um insano pela casa, depois de ter assassinado a mesa da sala. Acredito que alguns de vocês, também . Mesmo os que tiveram o privilégio de gritar golo naquele majestoso covil do Dragão ter-se-ão lançado numa desenfreada corrida mental para abraçar o André júnior e partilhar com ele a explosão de alegria que nos ofereceu.

Magia não existe. No sentido lato, é outra figura do nosso imaginário. Mas se algum dia houve alguma coisa mais próxima de magia neste universo dominado pelas leis da física, essa coisa é a mística. A mística não se explica. É expontânea. Existe. Multiplica o querer e a vontade. Transforma gatos em leopardos. A mística é intangível, mas viva. Está lá. Esteve sempre lá. Naquele renovado balneário de campeões. Andava meio adormecida. O pontapé de André André despertou-a.

Porque havia, e contra mim falo, quem começasse a questionar a cultura portista de um balneário cada vez mais plural e menos português (até este ano). Uma dúvida legítima que levantou uma questão exasutivamente repetida: onde está o nosso ADN? Perguntámo-lo aos jogadores, aos treinadores e até à estrutura. André André deu-nos ontem a resposta.

Ganhar ao Benfica não é objetivo, é imperativo. Nem sempre vai acontecer e isso é perfeitamente normal. Mas igualmente imperativo é nunca desistir de o tentar. Nunca se resignar.

André André mal conseguia falar na flash-interview. Pudera, uma grande fatia daquela alma ainda estava no campo, à procura do Samaris e a morder os tornozelos ao André Almeida, não fosse Artur Soares Dias ainda não ter acabado o jogo. André André fez um sprint de 25 metros aos 86', quando já tinha quase uma mini-maratona nas pernas, tendo ainda o discernimento de concluir com frieza aquela que era, provavelmente, a última oportunidade de golo do FC Porto naquele jogo.

Mística não é beijar o emblema. Longe disso. É sentir aquele brasão colado ao peito e colocar a vitória à frente da vida. É um sacrifício enorme, eu sei. Mas é precisamente por isso que nem todos a carregam. O filho do eterno António André explicou -- finalmente -- ao restante balneário o que é o FC Porto. André André. Eis a mística que faltava.


Umas milhas mais a sul, há uma nova atracção no freakshow do futebol televisivo português. Chama-se Augusto Inácio, diz-se que é o diplomata do Sporting, mas teve de arranjar um part-time na SIC Notícias, dada a falta de matéria de cariz internacional do seu clube.

O ex-pensador do futebol do Sporting, despromovido com a chegada do profeta à Mecca dos viscondes, viu-se forçado a procurar outras formas de agradar ao patrão, oferecendo-se para ir à televisão pregar a cartilha.

O que Inácio diz sobre a sua agremiação e os respectivos jogadores e dissidentes é com ele. Já toda a gente percebeu porque é que este lacaio de Bruno de Carvalho foi estrategicamente colocado onde foi.

O que é assombroso é o deslumbramento de Inácio, que leva o título de "responsável de assuntos externos" demasiado à letra. Externos do clube, Inácio, não externos ao clube. O FC Porto deve três meses de salário ao Rolando, guru? Leste isso no suplmento Vidas do Correio da Manhã? Ou terá sido na Antena 2 colombiana? Dois conselhos para ti, tradutor: começar a consultar com maior frequência o regulamento de transferências da FIFA antes de vomitar o que o teu presidente manda; ouvir a Antena 2 lusa, acredita que é bem melhor e mais plácida.

Não vale a pena insistires no deusismo. Volta para o escritório, vai a concentrações de Sportings de várias cidade do mundo, mas deixa de pressionar publicamente Carrillo a renovar. É feio. E, recuperando Rolando, nunca foi estratégia que resultasse. Nunca te julguei propriamente inteligente -- tens ar de lambe-botas de primeiro grau --, mas ver-te transformado em marioneta, a poluir ainda mais a já decrépita televisão portuguesa, é patético. Sobretudo quando nem sabes do que falas. Especialistas em verborreias existem aos montes. Tu arriscas-te a superar alguns deles. E olha que é difícil.

Deixa-te disso, mítico.

FC Porto 1 x 0 SLB: Pai, posso fazer História também?

Meio comando, uma pilha, seis bocados de uma travessa de barro comprada numa feira medieval em Óbidos, quatro pedaços de vela, três quartos de uma antiga cristaleira que a avó da minha esposa lhe deu para o "enxoval". Foi isto que sobrou do pontapé que dei na mesinha que tenho na sala, pouco passava das 20:55, hora de Lisboa. Ou 86', à escala de um clássico. Lembro-me de olhar para aquele chiqueiro todo que parecia tirado de um episódio de Shameless e pensar: "Estou fodido!". Mas valeu a pena. Valeu pela alegria incomensurável que aquela conclusão sublime de André André na cara de Júlio César me deu. A mim, aos 50 mil de pé no Dragão e aos milhões espalhados por este Portugal dos pequeninos, que como eu, viraram um dia as costas ao rebanho e seguiram o seu próprio caminho. Já tinha saudades de festejar uma vitória assim.

Nem tudo foi brilhante. O FC Porto deixou alguns sinais positivos, outros preocupantes. Pela forma como regressou dos balneários após o intervalo, este esquadrão -- sobretudo o seu almirante, André André, -- mereceu inteiramente os três pontos de um clássico suado, quente, competitivo e resolvido pela raça dos seus protagonistas. A segunda parte teve muito mais azul do que vermelho, mas a primeira, reconheçamos, teve menos FC Porto do que seria desejável. O bloco central portista, que tem quatro homens-chave para três posições, voltou a mostrar uma coesão e presença magníficas, onde só fica a faltar aquela pitada de sal que um elemento com outra craveira artística daria ao colectivo. Um 10 faz falta, digam o que disserem. Mas não é menos verdade que este meio-campo, assim como é, será determinante pela sua característica metamórfica, que possibilita um Dragão com várias faces distintas.

Hoje escolhemos ser um Porto de raça e combate. Era a combinação certa para dar tripla. O segredo foi André André. Mas Imbula, sem deslumbrar, mostrou que os tratores também ajudam a rebocar. E Rúben jogou sem medo de ser aquilo que é: um predestinado.

Eis as notas do primeiro clássico da temporada:


MAIS
André André: Eu fico pasmado com a grandeza deste pequeno jogador. É verdade que a casta é boa e que quem sai aos seus não tem o hábito de degenerar, mas devo dizer que nunca vi, nas quase três decadas que tenho de vida, um jogador tão parecido ao seu progenitor em campo. No estilo, na raça e na interpretação do jogo. André André é o pai emulado em campo. Não vou discutir se era mais rápido ou menos duro que António André, porque o pai já só o vi em DVD. Contudo, esta sequela promete ser tão boa ou melhor do que a primeira, pela entrega que o jovem André demonstra em campo, quando carrega esta insígnia. Para já, logrou aquilo que o pai nunca conseguiu: marcar ao Benfica. Há quem jogue pelo FC Porto e quem jogue pelo Porto. André André é claramente o segundo. E se dúvidas restassem neste seu processo de afirmação de azul-e-branco, o clássico de hoje dilacerou-as. Sem ver as estatísticas, aposto um tomate em como foi o elemento portista que mais segundas bolas ganhou. Ele que mede 1,77 metros. Além disso, esteve sempre muito interventivo e revelou uma inteligência nata na forma como "interrompeu" o jogo nas saídas de bola do adversário. Depois, claro está, o golo. Uma jogada de fino recorte rematada por ele. André André está mais que pronto. Para o FC Porto e para a Selecção. Mais importante do que isso, André André está pronto para fazer História de dragão ao peito. Tal como o pai.

Aboubakar: O camaronês continua a barrar muita manteiga. Está a crescer tão depressa como um Labrador e mostra, a cada partida que soma, o material de que é feito. É muito mais do que um ponta-de-lança. Hoje foi novamente o quarto médio da equipa, prejudicando-se a si próprio quando a bola pingava na área e Aboubakar não estava lá. Precisa de alguém atrás que lhe dê a liberdade total para dar água pela barba aos centrais. Falhou um golo cantado, mas antes dele Jackson também o fazia e antes de Jackson, Falcao também o fazia. Quem não se lembra daquela bola à trave do colombiano no clássico do ano passado? Acontece e não retira qualquer brilho a mais um jogo de enorme capacidade de luta deste jogador. Com ele em campo, o FC Porto joga com doze. E como futebol não é só futebol, é um orgulho ver um gajo que após levar uma traulitada na área para penalty, não se resigna ao facilitismo da falta, levanta-se e ainda tenta o golo. E logo a seguir cumprimenta o moribundo GR adversário num gesto que congelou por segundos a rivalidade Norte/Sul. Aboubakar é digno deste emblema. Pela qualidade e pelo fair-play. Porque para o camaronês, o que interessa é jogar à bola, como naqueles tempos em que corria descalço nas ruas de Yaoundé, com o cheiro a terra quente de África. Futebolista de elite. Homem com H.

Maxi: Maxi, a esta hora és provavelmente o maior porco javardo que alguma vez passou no futebol português. Há até quem te deseje uma lesão para a vida ou a morte por impalamento. E sabes porquê? Porque estás num país de almas tristes. Porque a nomenclatura varia consoante a lente. Porque raça em azul escreve-se javardice a vermelho. Porque dureza em azul lê-se maldade a encarnado. Tu até podes ser o mesmo Maxi de sempre. Impetuoso, raçudo, gattusico, rijo, às vezes exageradamente agressivo em prol das cores que defendes e, acima de tudo, um escudo humano do teu grupo. Mas só foste bom enquanto foste vermelho. Sob o manto sagrado protetor, todas os defeitos são virtudes. É dogmático. Agora que estás do outro lado, convido-te a contemplar a desonestidade que serviste durante oito anos. E já reparaste como estás a ser mais amarelado do que nunca? É fácil ser Benfica. É difícil ser Porto. Muito difícil, neste país de impostores. Mas nada temas; aqui serás abraçado como um filho. Tens alma, Maxi. O "dois" fica-te bem. Tão bem.

«Os jogadores do Benfica defendem a camisola deles e eu a minha»

Corona: Não é um + pela exibição, mas pela circunstância. Tendo em conta que jogou o primeiro clássico pelo FC Porto logo no segundo jogo a titular, com apenas três semanas de casa e, durante 25 minutos, fora da sua zona de conforto, devo dizer que não se inibiu como previa, perante a carga psicológica que a partida impunha. Na primeira parte, esteve melhor do que o colega da outra ala, mas terá sido o primeiro a ser sacrificado na segunda pelo facto de Brahimi estar mais identificado com os processos de circulação da equipa e porque Varela casa muito melhor com Maxi, na direita do ataque portista. Tem uma qualidade técnica magistral e quando pega na bola torna-se difícil de o parar. Foi absorvido pela dormência da equipa na primeira parte. No entanto, apresentou bons pormenores e na etapa complementar acompanhou o ímpeto do grupo no assalto ao palácio do Calígula, até ao momento da sua saída. Com este jogador, o FC Porto ganhou dois abre-latas de peso em cada ala. E quando ambos -- Brahimi e Corona -- carburarem a mil, as asas do FC Porto vão ganhar outro dinamismo.

Alterações: É provável que este ponto figure nas notas negativas da uma parte dos meus colegas da Bluegosfera. Especulo eu, dada a reação do estádio às substituições dos dragões. Contudo, Lopetegui foi inteligente nas duas primeiras mexidas. A última, mais controversa, talvez pudesse ter sido fortemente contestada se o FC Porto não vencesse. Vamos por partes. A entrada de Varela era expectável e necessária, não só pelo desgate a que os extremos estavam sujeitos, como pelo facto de o capariquense ser o jogador do plantel (a par de Maxi) com mais sangue circulado em clássicos. A título de curiosidade, era também o elemento do plantel com mais golos marcados ao Benfica. E, por norma, costuma ter bons desempenhos nos encontros contra o rival. Embora não tenha tido uma entrada auspiciosa, é da sua astúcia que nasce a vitória. Rúben por Danilo foi jogar areia na massa. Resultou, deu consistência e a equipa, que já não precisava de tanta circulação de bola mas de ganhar as sobras de um jogo cada vez mais directo, instalou-se em definitivo no meio campo adversário. Com Danilo em campo, o Benfica não voltou a rematar. Já a troca de Aboubakar por Osvaldo pode ser interpretada como pouco ambiciosa. No entanto, Lopetegui não estava com isso a querer jogar para o empate, mas a preservar a frescura no centro, evitando assim tocar no principal motor da avalanche portista da segunda parte: o meio-campo. Compreensível.


MENOS
Primeira Parte: O FC Porto entrou demasiado apático no jogo e permitiu a supremacia ao adversário nos primeiros 20, 30 minutos de jogo. Essa passividade podia ter ficado cara, não fosse o talento de Casillas e a assertividade do quarteto defensivo do FC Porto. A equipa jogava perante o seu público, na máxima força, contra um rival ainda à procura da melhor forma, mas parece ter acusado as depesas do jogo com algum nervosismo. O mérito deve-se também à equipa do Benfica que conseguiu produzir futebol durante esse período, impedindo que o meio-campo portista tomasse conta do encontro. Com o tempo, veio igualmente o equilíbrio. E é claro que é sempre preferível terminar a começar por cima. Ainda assim, a falta de chama dos dragões na etapa inicial assustou.

Brahimi: Brahimi não fez um mau jogo por assim dizer, mas esteve demasiado previsível nas suas ações, só se conseguindo soltar a espaços, quando a equipa já estava instalada no reduto encarnado. Continua a individualizar em demasia, quando até tem em Layún um bom complemento atacante. O argelino ainda não responde com frequências às diagonais propostas pelo mexicano. Natural, por um lado, pela falta de rotinas com o companheiro, mas um processo a consolidar o mais cedo possível.

Bolas paradas: Continuam a ser uma nulidade. Existem evidências de jogadas de laboratório, como o lance em que Layún desmarca Brahimi, com um passe de rutura que deixou o argelino praticamente isolado. Porém, é nas bolas despejadas para a área que o FC Porto teima em não acertar o passo. Se, no ano passado, 50% do problema se devia aos frouxos cruzamentos de Quaresma na direita ou às charutadas de Tello na esquerda, este ano, os centros até têm sido bem executados pelos novos protagonistas mexicanos -- Layún e Corona. O problema é que a correspodência raramente encontra destinatário, como sucedeu hoje, e é pouco provável que um canto termine em remate à baliza adversária. O FC Porto tem jogadores altos. Check. O FC Porto tem músculo. Check. O FC Porto tem bons cabeceadores. Check. O que falha? Organização posicional ofensiva, eventualmente. Um aspecto que Lopetegui tem rapidamente de corrigir.


Momento: Intervalo. Não sei bem o que Lopetegui disse aos seus pupilos durante o descanso, mas ao contrário do que tem acontecido nos últimos jogos, o intervalo não provocou sonolência. Pelo contrário, foi o toque de despertar de que a equipa necesitava para contrariar este estranho Benfica de Rui Vitória. Foi o ponto de viragem no jogo e o mote para o domínio das operações na etapa complementar. Lopetegui não tem primado por discursos revigorantes, mas desta vez soube escolher as palavras certas durante a pausa. Isso ou prometeu aos jogadores que mudava de penteado se eles ganhassem o jogo.


Pormenor: Ao contrário do catedrático, ainda sou dos que acredita no fair-play. Como o passou-bem de Aboubakar a Júlio César, ou aquele segredo que só Luisão e o camaronês sabem porque motivou tanta gargalhada entre dois soldados de lados opostos. Ou até Gaitán a defender um isolado Maxi, que jogou contra tudo e contra todos. Sururus, há sempre. Nos clássicos, é condição sine qua non. Trata-se da resposta natural do nervo à competitividade. Mas é bonito constatar que, em certos momentos, a amizade ainda prevalece sobre tudo o resto. Inclusive sobre o futebol. Se não for nas bancadas, que seja assim nos relvados.



Ganhámos o clássico. 
É o que realmente importa.

Quatro pontos a mais do que o mais forte candidato ao título e um "quinto" com a vantagem à maior no confronto directo, até ver.

Entretanto, sabe Deus que justificação vou arranjar para dizer à maria que virei a mini-mesa da sala ao contrário com um chuto. Parafraseando um grande amigo meu, quanto mais velho estou, mais criança estou. Estou tão fodido. Mas tão contente.

domingo, 13 de setembro de 2015

FCA 1 x 3 FC Porto: É duas Coronas e um pires de camarão-tigre, ó sôr André

Sejamos honestos. Não há maior hipocrisia no léxico do futebol português do que aquele clássico chavão do: "só pensamos em nós próprios". É uma expressão falaciosa, perigosa até. Primeiro, porque o futebol não é conjunto de ilhas isoladas, mas um sistema encadeado de partidas, eventos e factores que não são independentes e exercem influência entre si. Segundo, porque quem acredita realmente nessa filosofia arrisca-se a ter tanto sucesso na carreira como Luís Campos. Por isso, era fundamental dar uma resposta contundente à goleada do Benfica na véspera, que não só galvanizou o rival na antecâmara de um clássico, como deixou o FC Porto em sentido e obrigado a dar troco no campo anímico. O futebol é um jogo de parada e resposta que vai muito além do relvado, do banco ou da bancada. É preciso ser mais forte a todos os níveis. E seria escusado dispararem aquele outro velho prolóquio do futebolês de que para o adversário "foram só três pontos". Não vale a pena. Todos sabemos que isso não é bem assim. E de lugares-comuns, está o futebol cheio.


Mais, era preciso resistir à pressão avassaladora do Sistema, que ontem voltou a largar-nos um tronco no caminho. João Capela tinha a missão clara de complicar o jogo e descomplicar o campeonato. Cedo mostrou o motivo pelo qual foi eleito para um dos encontros mais delicados da época para o FC Porto: a sua relação com a cartolina. Quase aposto que a cadeira favorita deste rapaz na preparatória era Educação Visual tal é o prazer com que exibe os rectangulozinhos do castigo. Foi cuspir amarelos como se não houvesse amanhã e sempre para o mesmo lado. Até a Cofina manifestou um certo espanto com mais uma capelada com elevada nota artística. 

Respondemos a tudo. E bem. A máquina mostra-se cada vez mais oleada e ontem, num terreno difícil e onde muitos irão certamente cair, a equipa ofereceu alguns lampejos do bom futebol à Porto, com movimentações ofensivas interessantes e várias vezes em alta rotação. Em campos como o de Arouca, não se pede ópera, mas uma sinfonia que funcione. Aconteceu. Algo que só nos pode deixar confiantes para o que vem aí. 

Notas, notas:

MAIS
André André: Ou deverei dizer André André André André? Como vi a partida num casamento, e sob os efeitos naturais de quem está num local com bar aberto, pensei que já estava tão bêbado que via Andrés a triplicar. Mas não, é apenas um que vale por muitos. Primeiro pela polivalência que empresta ao colectivo, sendo aquele gajo que mete logo a mão no ar quando é preciso sacrifício e trabalho forçado. Foi o pêndulo que conectou a tracção de Imbula com a suavidade e elegância de Ruben Neves. Mesmo na esquerda, após a saída do francês, não desapareceu do jogo e ajudou a dar corpo ao miolo, numa altura em que Lopetegui pretendia sobrepovoar o meio-campo para conter o avanço dos homens de Lito. Há muito que o André filho reclamava a titularidade. Quando foi contratado ao Guimarães, depois de tantos vai-não-vai, festejei de punho cerrado no ar. A SAD do FC Porto marcou um golo de belo efeito com o resgate deste pequeno grande jogador.

Corona: Se foi para isso que vieste... então ainda bem. Primeiro jogo, primeira amostra daquilo que podemos esperar deste jovem mexicano com nome de cerveja com tchiripiti. Exibição feliz, na estreia na Liga Portuguesa, a mostrar uma velocidade sensacional e uma inteligência de movimentos admirável para um miúdo de meros 22 anos. Para quem chegou há tão pouco tempo, confesso-me surpreendido com a forma como se deu bem com as manobras atacantes de equipa, parecendo até que tinha feito a pré-época com o restante grupo. Corona tem traço de artista, ao qual lhe junta um poder de fogo invulgar para um extremo e que será certamente a salvação em noite de desinspiração de Aboubakar ou Osvaldo. Além disso, mostra aquilo que Tello ou Varela por vezes parecem não ter: confiança em si próprios.

Rúben Neves: Mais classe do que isto só Michael Caine em Dirty Rotten Scoundrels.
Rúben tem, aos 18 anos, potencial para ser o jogador mais parecido com Paulo Sousa que alguma vez o futebol português teve. Trata a bola com uma sensibilidade impressionante e às vezes dá a impressão que joga de comando de Playstation, tal é a maneira como vê desmarcações que nem num LED de 52 polegadas um tipo descortina e ainda pica o esférico com uma precisão militar assombrosa, que me faz duvidar se aquilo foi chuteira ou L1 + Δ. Falta-lhe poder de choque, verdade. Mas eu com a idade dele nem a luta contra dias de vendaval vencia. Vai a tempo, bem a tempo, de ser um dos melhores da nova geração que alguma vez pass(e)ará nos relvados lusos. Um regalo para gerir com pinças.


MENOS
Brahimi: Um pouco menos intenso do que em jogos anteriores, acabou bem substituído. Tentou muita coisa, mas muita coisa saiu mal, em dia-não para o argelino. Talvez esteja a acusar algum cansaço de ter sido o principal transportador de jogo nas partidas anteriores.

Entrada de Bueno: Fazer entrar um jogador para lhe dar minutos a escassos 180 segundos do fim é o mesmo que dar festas ao porco antes de o matar. Este tipo de prática, que nem beneficia o jogador nem a equipa, só faz sentido quando é necessário somar um "terceiro" central à área ou meter mais avançados para o chuveirinho final. Para dar rodagem, nunca. Esta estratégia fonsequiana não só pressionou ainda mais o jogador como era escusada: o FC Porto já vencia por 0-3 ao 71'. E não foi certamente para estancar defensivamente a equipa que Alberto Bueno pisou o relvado. Uma pequena mancha no registo de Lopetegui, que até teve uma noite de boas decisões e grande leitura táctica do jogo. Quanto ao avançado espanhol, fez tudo impecavelmente bem nos três lances que disputou no curto tempo de exposição que teve para brilhar.


Momento: Minuto 15'. Imbula, André André, Rúben, Corona, Aboubakar, Corona outra vez, golo. Foi provavelmente a jogada colectiva mais bem desenhada do FC Porto esta temporada. Processos simples, passes rápidos e seguros, progressão em bloco, um toque magistral de Aboubakar e a tal inteligência na movimentação de Corona. Belo tento do FC Porto, que acima de tudo, aliviou a equipa e desbastou o trilho para a vitória.


Pormenor: Jesús Corona bisou na estreia pelo FC Porto, igualando um feito com quinze anos. Em 2000/2001, "Pena", também ele outra contratação de última hora do defeso azul-e-branco, precisou apenas de meia-hora para bisar no primeiro jogo com a camisola portista. Pena era um tipo curioso. Embora trapalhão nato, tinha rasgos à Ronaldo, o fenómeno, com a mesma frequência com que passa o cometa Halley. Essa época foi, aliás, um marco de fenómenos. Pena marcou cerca de 30% dos golos (21) que marcou em toda a carreira profissional (65) e o Boavista foi campeão. Outro fun fact: Pena era a alcunha que escondia o mesmo nome que ontem fez história: Renivaldo Pereira de Jesus. No FC Porto, Jesus é um nome abençoado, portanto. Como dizia o outro: 'Tá Engrassade.

A paragem para os jogos das seleções foi menos nefasta do que costumava ser nos últimos anos. A equipa ressurgiu fisicamente mais forte e superou um teste psicológico exigente. A rotatividade resultou e o FC Porto parte para a Ucrânia com a casa limpa.


Antes de receber o Benfica, vamos a Kiev e é nessa partida que os atletas terão de se focar primeiro. Um bom resultado contra os ucranianos será crucial para manter o percurso ascendente da forma.


Porque futebol é sequência e consequência, quer queiramos quer não.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Estórias de embalar: Jagunço e os dois bancos

Era uma vez Jagunço.

Jagunço tinha fama de ladrão, mas não era um gatuno qualquer. Nata fina, larápio de primeira água, figurava entre a elite. Verdadeiro ás da arte da bandidagem, nunca descurava o pormenor e estava sempre um passo à frente da concorrência.

Astuto e perspicaz, Jagunço sabia o segredo do crime perfeito. Palmar às claras. Quem rouba em público, raramente é apanhado. Porque um cavalheiro da ordem, acreditavam as gentes honestas e humildes daquela região, não pode ser ao mesmo tempo um cavaleiro do apocalipse.

Na terra sem lei de Jagunço, havia dois bancos. O Banco Bom e o Banco Mau. No primeiro, Jagunço tinha conta. O segundo, Jagunço não tinha em conta.

Por isso, o Banco Mau era o alvo predilecto de Jagunço. Quanto mais o pilhava, mais vontade tinha de o pilhar. Fim-de-semana sim, fim-de-semana não, lá ia mais um saque. Um dia, até o telhado levaram. Era um brinquedo nas mãos de Jagunço, o Banco Mau.

Tornado patrão da pandilha, Jagunço há muito que já não fazia. Mandava fazer.

Encomendava os golpes aos seus mais fiéis capos. Um deles, o canalha benjamim, meliante promissor, chegou a perpetrar dez furtos ao desafortunado banco. Todos eles executados na perfeição.

O jovem trafulha era tão eficaz que Jagunço decidiu elevar-lhe a fasquia. Certo dia, na véspera da enésima investida, Jagunço enviou uma carta ao Banco Mau a anunciar o assalto. Fê-lo pelo vil prazer do rebaixamento alheio. Jagunço não idealizava enxovalho maior do que informar a própria vítima antes do golpe.

Surpreendido, o gerente do Banco Mau preparou-se a si e aos seus. Armou os seus empregados com garra, brio e coragem, chamou alguns reforços e aguardou pelo roubo iminente.

Nesse dia, o Banco Mau venceu. O jovem bandalho foi subjugado e fugiu de mãos a abanar. Prometeu voltar de pistola, o infame. Enquanto celebrava o feito com a sua equipa, o gerente do Banco Mau olhou pela janela e viu um Jagunço perplexo do outro lado da estrada.

Foi a primeira e última vez que alguma vez se falaram:

Diz-me, Jagunço, o que tens tu contra o Banco Mau?

Nada, meu caro. Mas para o Bom continuar a ser bom, o Mau não pode deixar de ser mau.



quarta-feira, 9 de setembro de 2015

É para vocês, a pizza?


Enquanto não rola a bola -- a nossa e não a “nossa” -- vamos empanturrando o cérebro com outros prazeres. Alguns comuns, alguns secretos. Como ver ex-primeiros-ministros a sair da prisão com uma indumentária digna de uma noitada na Kapital. Ou assistir impávidos ao bombardeamento de um pobre de um estafeta da Telepizza com perguntas obtusas e bizarras de uma proctologista de elefante mascarada de jornalista. É o que dá recrutar no Urban, cofinenses.

Por falar nesse erário deprimente que é tudo o que tenha chancela Cofina, o ponto alto da semana para o Record terá sido a entrevista ao catedrático. Alto para eles, porque eu vivo num mundo ao contrário. Ainda assim, devo reconhecer que a entrevista teve mais sumo do que eu esperava. Que o catedrático fede a uma sobranceria insuportável já se sabe. Afinal, é apanágio do eterno imberbe. Mas toda essa arrogância vem com um preço, o do orgulho desmesurado, que obriga Jesus a ir 'a todas' e ultrapassar a fronteira do clichê.

O catedrático não prima pelo QI, mas está longe de ser uma mina de lugares-comuns. Se é controverso, ele fala. Se roça o escândalo, ele vai lá. Dificilmente Jesus se desvia de um assunto, para demonstrar precisamente que sabe pensar pela sua própria cabeça. Neste chorrilho de dez páginas, não foi diferente. O besuntas foi caindo, mais ou menos deliberadadamente, nas armadilhas que lhe foram espalhando durante a conversa.

Contou a sua versão da saída do Benfica, falou da saída de Maxi para o FC Porto, abordou a possibilidade de perder Carrillo, admitiu ter ficado preocupado em perder Douglas e Danilo e não se coibiu de relevar algumas das manobras de bastidores do "seu" Benfica, colocando a boca no trombone sobre práticas que só mesmo num pasquim de Lisboa não têm chamada de capa. Falou de plantações, não as colombianas, mas outras de cariz mais estratégico e direccionadas para a arte da manipulação informativa, que apesar de não serem novidade nos meandros, ajudam a antever o que espera ao FC Porto este ano. É bom ver tinta nessas alegações, mais que não seja, como afirma o caro Miguel Lima, para a sempre útil "memória futura".

Houve apenas um assunto que deixou Jesus sem resposta: o FC Porto. Como sempre. Mas mesmo o silêncio é palavra. E o do Jesus foi manifesto. Então não tinhas já chegado ao topo, mestre da (es)tática? Ou estarás a preparar a ressurreição no mesmo lugar onde tantas vezes foste crucificado? És verdadeiramente bíblico.

Já a entrevista do ex-melhor amigo do catedrático, o barão vermelho-e-branco, vulgo bigode soviético, não me suscitou interesse. Se quiser propaganda, leio os folhetos do Lidl.

Propaganda também se vende sob a forma de conivência. O caro Imbicto explica-vos melhor este novo "exercício interessante" de fazer publicidade sem fazer publicidade. Talvez isto elucide por que razão, para alguns jornalistas da circomunicação social, 2+2 são sempre 5. Ou então é uma nova forma de convívio amigável, após uma reunião de agenda entre plantadores e plantados. Era para vocês, a pizza?

Finalmente, ainda sem sair do domínio da Cofina, porque hoje é como aquele dia em que temos de limpar o carro depois do próprio casamento -- ou seja, mexer na merda à grande e à francesa --, Vítor Baía, um guarda-redes de quem guardarei sempre as melhores recordações entre os postes do FC Porto, soma "frangos" atrás de "frangos" fora das quatro linhas. O que é pena. Ainda não compreendi bem se o nosso 99 quer seguir as pisadas de Dani ou se é simplesmente pouco inteligente a filtrar informação. Passe a redundância.

Na melhor das hipóteses, Baía foi equivocado por alguém mal-intencionado. Nem era preciso desmentir a história de um telefonema que nunca podia ter existido neste universo lógico. Irónico: nesta altura da sua "carreira", Vítor Baía tem de saber defender-se a si próprio. Ou corre o risco de cair irreversivelmente no abismo do ridículo. O primeiro passo podia ser abandonar já a Correio da Manha TV. Assim mesmo, sem til. Não há pontuação possível para um antro jornalístico mais rasteiro do que uma húngara.

Prosa leve, porque estou de férias e o meu futebol também. Pelo menos até sábado, quando formos a Aveiro Arouca. Para esmagar tolos e tolinhos.

Até lá, recomendo a mais recente bordoada pública do presidente sem medo. BDC em entrevista à BBC, com o sotaque de uma alheira. Vítor Pereira vai parecer Bernard Shaw depois disto. Beeleeve mii, tragam pipocas que esta pérola vale umas boas gargalhadas em cadeia.

Ah, carai, cadeia não, que eu não estou preso!